Capítulo 13 - Administração e Construção Partidária.

Da Parte 1 do Projeto Ação PT de Diretório Zonal

Faz parte da tradição das esquerdas - ignoro desde quando - considerar o partido político como uma obra de engenharia. Sei que, em 1901, Lenin publicou no jornal russo Iskra um artigo intitulado "Por onde começar?", em que compara o partido a um edifício em construção. Ele dizia:

"A missão do jornal não se resume, no entanto, a difundir idéias, a educar politicamente e a conquistar aliados políticos. O jornal não é só um propagandista coletivo e um agitador coletivo, mas também um organizador coletivo. Neste último sentido se  pode comparar com os  andaimes que se levantam ao redor de um edifício em construção, que assinalam seus contornos, facilitam as relações entre os distintos construtores, ele ajuda a distribuir a tarefa e a observar os resultados gerais alcançados pelo trabalho organizado."

No ano seguinte, Lenin desenvolveu as ideias propostas em "Por onde começar?" num texto intitulado "Que fazer?", em que repetia a analogia da construção de um edifício:

"Os que vêem no 'plano' do Iskra apenas 'literatura', não o compreenderam em sua essência; tomaram como fim o que se propõe, no momento presente, como o meio mais indicado. Essas pessoas não se deram ao trabalho de refletir sobre as duas comparações que ilustram esse plano de maneira relevante. 

A elaboração de um jornal político para toda a Rússia - escrevia-se no Iskra - deve ser o fio condutor: seguindo-o, poderemos desenvolver ininterruptamente essa organização, aprofundá-la e alargá-la (isto é, a organização revolucionária sempre pronta a apoiar todo protesto e efervescência). 

Por favor, digam-me: quando, os pedreiros colocam em diferentes pontos as pedras de um enorme edifício, de linhas absolutamente originais, esticam um fio que os ajuda a encontrar o lugar justo para as pedras, que lhes indica o objetivo final de todo o trabalho, que lhes permite colocar não apenas cada pedra, mas até cada pedaço de pedra que, cimentado ao que o precedeu e ao que o sucede, formará a linha definitiva e total. 

Será isto um trabalho 'de escrita'? Não é evidente que, hoje, atravessamos em nosso Partido um período em que, possuindo as pedras e os pedreiros, falta-nos exatamente esse fio que fosse visível para todo o mundo e ao qual cada um pudesse se ater?"

E cita o trecho de "Por onde começar? em que compara o jornal nacional que propõe a um conjunto de andaimes:

"O jornal não é só um propagandista coletivo e um agitador coletivo, mas também um organizador coletivo. Neste último sentido se  pode comparar com os  andaimes que se levantam ao redor de um edifício em construção, que assinalam seus contornos, facilitam as relações entre os distintos construtores, ele ajuda a distribuir a tarefa e a observar os resultados gerais alcançados pelo trabalho organizado."

Quase um século antes de Lenin, o general Clausewitz, em seu livro "Da guerra", valia-se da mesma metáfora da construção para descrever a organização de um exército. Ele dizia:

"Por formação de batalha referimo-nos à distribuição e à composição das armas* como partes individuais do todo, bem como a disposição que servirá como uma forma padrão durante toda a campanha ou durante toda a duração da guerra. 

Assim, num certo sentido a formação de batalha consiste num componente aritmético e num geométrico: organização e disposição.  

O primeiro tem origem na organização normal do exército em tempo de paz. Determinadas partes, como batalhões, esquadrões, regimentos e baterias são tratados como unidades que servem como blocos de construção para estruturas maiores que, por sua vez, formam o conjunto, dependendo das exigências do momento." 

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* Armas - arma é cada uma das divisões de um exército (infantaria, artilharia, cavalaria, etc.)

Note-se que a palavra "organizador" tem, para Lenin, o mesmo sentido que "construtor". Ele compara o jornal a um andaime e o militante a um pedreiro. Para ele, construir o partido é o mesmo que organiza-lo. Ou seja, construir o partido seria adicionar, incorporar a ele novos elementos, distribuindo-os numa estrutura interna previamente planejada, conforme algum critério.

Meu conceito de Construção Partidária é o seguinte. Construir um partido é filiar simpatizantes e criar e manter estruturas e mecanismos que permitam o uso racional de suas contribuições financeiras, conhecimentos e habilidades na realização de ações políticas coletivas. As estruturas são os diretórios. Os mecanismos são as regras de funcionamento interno definidas no estatuto do partido.

Nem Clausewitz, nem Lenin, usam a palavra administração ou fazem referência a qualquer teoria administrativa porque a administração só virou teoria em 1916, com o lançamento do livro "Administração Industrial e Geral", do francês Henri Fayol. Mas os princípios enunciados nesta obra de Fayol, já estão claramente presentes no pensamento de Lenin e Clausewitz, já que tanto Lenin, quanto Fayol tinham a organização militar como modelo. É possível até que tenham lido a obra do general prussiano.

A administração evoluiu e se consagrou como ciência social graças ao êxito prático dos que empregaram suas teorias. Os partidos socialistas, no entanto, continuaram presos ao be-a-bá de Lenin e, até hoje, preservam os termos "Construção Partidária" ou "Organização Partidária", que correspondem à maneira como os socialistas concebiam a missão do dirigente partidário no início do século 20.

Creio que seja hora de dar um passo à frente, de avançar para a incorporação de conhecimentos e práticas que podem ser úteis à luta pelo socialismo e que até agora tem sido desprezados. É hora de avançar para a "Administração Partidária", de entender que a construção ou organização do partido dependem da realização de outras funções, como o planejamento, a liderança da execução e o controle da realização de cada tarefa, que em seu conjunto constituem o que se convencionou chamar de processo administrativo.

Se hoje já se sabe que a construção de um edifício precisa de correta administração para ser bem realizada, é preciso admitir que a construção do partido exige o mesmo. Sem administração projeto nenhum sai do papel. A administração é um meio fundamental para a realização de qualquer construção. Por isso considero a Administração Partidária como um meio para a Construção ou Organização Partidária, absolutamente essencial para o cumprimento das determinações do estatuto do partido e para a correta realização das suas estratégias e táticas.

Em 2013 eu ainda pensava, como todo militante de esquerda, em "construção" ou "organização" do partido. No momento em que comecei a escrever sobre isso, tive a necessidade de definir a palavra "organização" e pesquisando descobri que a palavra "organização" tem na verdade dois sentidos, o de unidade social deliberadamente constituída para alcançar um objetivo e o de terceira etapa do processo administrativo. Esta informação foi determinante para que eu passasse a distinguir, na elaboração de minhas propostas, a organização da administração. Entendi que a organização era parte da administração e vi que era de administração, e não só de organização, que o PT precisava. Estudando os conceitos da administração e refletindo sobre o partido, cheguei às seguintes conclusões:

1 - Um partido político e seus diretórios são organizações.

2 - Organizações são unidades sociais - grupos de pessoas - deliberadamente constituídas para atingirem algum objetivo.

3 - O desempenho das organizações depende da forma como são administradas.

4 - Administrar é decidir o modo como serão usados os recursos de uma organização na realização de ações destinadas à conquista dos seus objetivos.

5 - O melhor uso dos recursos de uma organização se consegue:

a) quando se tem clareza do objetivo principal da organização;

b) quando se tem profundo conhecimento e pleno domínio dos recursos da organização;

c) quando se consegue estabelecer as ações mais eficazes para atingir os objetivos da organização, considerando o volume e as características dos recursos disponíveis;

d) quando se consegue definir corretamente o modo como serão distribuídos os recursos da organização na realização das ações estabelecidas, ou seja, quando se consegue definir corretamente quem faz o que, onde, quando, como e com que meios; quando se é capaz, enfim, de identificar e designar corretamente a pessoa mais apta a realizar cada tarefa;

e) quando se consegue influenciar e motivar os membros da organização a realizarem as tarefas que lhes são designadas conforme as orientações recebidas; e

f) quando se consegue avaliar corretamente o desenvolvimento das ações realizadas e, a partir disso, fazer as devidas correções e os devidos ajustes nos processos adotados.

Tudo isso compõe o que se convencionou chamar de processo administrativo ou, simplesmente, administração.

6 - Toda atividade partidária se dá em dois níveis: o político e o administrativo. A política define os princípios, os objetivos, as ações necessárias para alcançá-los e as ações possíveis de serem realizadas, considerando as circunstâncias externas ao partido, mais precisamente, a correlação entre as forças políticas em disputa na sociedade. Já a administração responde à política dizendo o que é possível ser feito, considerando as circunstâncias internas ao partido, mais precisamente, a disponibilidade de recursos para a realização das ações pretendidas. Com base nesta avaliação, a política toma a decisão final e a administração a executa. Esta, a meu ver, deve ser a dinâmica da relação entre política e administração para garantir o funcionamento adequado do partido. Sem este diálogo, entre política e administração, a política não sai do discurso. Porque a administração é quem, de fato, realiza a política. 

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