quinta-feira, 4 de julho de 2013

"O que se quer é um partido que não se desmantele ao primeiro golpe militar." (José Dirceu, sobre o PT, em 1986)

(Mensagem enviada à lista de e-mails do 1º Diretório Zonal e publicada em sua página na web em 4 de julho de 2013, com os números 13475 e 13476)

Por José Dirceu, em 1986 - "(...) Outra característica básica do PT é ser um partido de massa. Esta característica não é secundária ou de menor importância. Ela é fundamental para a luta política no Brasil. Ela significa que o PT tem, como centro de suas preocupações, a necessidade de manter o impulso histórico que agregou milhares e milhões ao seu projeto. Significa a interação do partido político, que é uma vanguarda, com este conjunto, com esta base social. Significa impedir que essa vanguarda se descole, se desligue dessa base social, ou que essa base social se dilua. (...) 

Entretanto não basta ser um partido de massa, um partido independente e um partido socialista. É preciso ser um partido de luta de classes, um partido que organiza, e que tem uma retaguarda política, ideológica e de força real na sociedade. Por isso surgiu, no debate do PT, como concepção de socialismo, em primeiro lugar, a manifestação de sua solidariedade a todas as massas oprimidas do mundo. Em segundo lugar, a afirmação de que o poder não apenas se toma, mas também se constrói. Essa frase foi tomada por muitos companheiros do PT como reformista, socialdemocrata, tese de centro, de direita, ou de construção do poder passo a passo. Ou como tese claramente não socialista.

O que essa ideia expressa, porém, é que o PT pretende construir, desde já, o poder popular, colocando na ordem do dia a construção do socialismo. Ou seja, o poder da classe trabalhadora, seja do ponto de vista ideológico, disputando a hegemonia ideológica com a burguesia na luta anticapitalista e pelo socialismo; seja disputando a direção e hegemonia sobre outros setores sociais; seja na luta de classes, construindo organismos, primeiro o próprio partido, com núcleos, filiação em massa, mas com quadros formados politicamente, num processo real de acúmulo de forças.

O que se quer é um partido que não se desmantele ao primeiro golpe militar, que não fraqueje diante da primeira repressão a uma greve geral. Um partido que tenha núcleos, tenha militantes conscientes, tenha capacidade de responder, quando for necessário passar da luta política eleitoral para a luta de massas, para o confronto com a burguesia. Um partido que tenha uma retaguarda, tenha uma militância, tenha uma compreensão histórica e política sobre a necessidade da luta e da tomada do poder.

E um partido que procure construir sindicatos autônomos e independentes do Estado, sindicatos unitários, que congreguem a maioria dos trabalhadores na luta por suas reivindicações e contra o capitalismo. Que procure construir entidades de massa que lutem pela reivindicação de melhores condições de vida para os trabalhadores, mas também pela constituição de um poder que controle, fiscalize o Estado e seja germe do poder popular. (...) 

Mas é preciso construir o projeto socialista do PT. Este desafio está colocado para nós agora. Ele exige o alargamento e o aprofundamento da base social do PT, a formação de milhares de quadros, a educação de seus filhos e dos próprios trabalhadores, a capacidade de ter uma imprensa, de ter uma política para o movimento popular e sindical, de ter uma política parlamentar e uma política para governar no capitalismo. Isso sem claudicar de sua proposta socialista, sem cair no reformismo e sem ser absorvido, seja pelas alianças de classe, seja pela administração pública de governos e prefeituras, seja pela atuação no parlamento.

Esse é o desafio colocado ao PT pela conjuntura de 1986. Podemos ganhar governos de estado, uma possibilidade real, ainda que improvável. Seguramente elegeremos bancadas parlamentares expressivas. E a Nova República e a Aliança Democrática se esgotam a passos acelerados. Outras facções burguesas, bem como outros setores da esquerda, tentarão apresentar alternativas para o momento. O PT também precisa desenvolver agora uma alternativa global para apresentar a outros setores sociais e políticos, e ser o eixo desta alternativa. Mas não poderá apresentar essa alternativa e ser bem sucedido, se não for capaz de desenvolver a sua perspectiva socialista, e o seu projeto enquanto partido dos trabalhadores, independente, com uma organização e uma base social próprias. Porque senão ele estará fadado, necessariamente, com o processo da luta de classes, a ser absorvido, deformado ou deturpado pela luta social, pela luta política, pelo exercício do governo ou pelo exercício da atividade parlamentar."

[Trechos do artigo "Os desafios do PT", de José Dirceu, constante do livro "E agora, PT: Caráter e Identidade", da Editora Brasiliense, publicado em 1986]

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