domingo, 31 de janeiro de 2016

Debate e democracia: PSOL defendeu voto nulo no 2º turno entre Dilma e Aécio?

(Mensagem publicada na lista de e-mails do 1º Diretório Zonal, em resposta à companheira S.)

S.

Já é a segunda vez que você me vem com essa conversa. Lá no Facebook eu já te disse: não tento impor e nem tenho poder para impor nada. Quem tem poder são os dirigentes do partido, eles sim, estão impondo algo que a base não quer. Informe-se melhor, por favor. Os dirigentes do PT já estão em campanha eleitoral para o candidato do PMDB, Pedro Paulo. Campanha dentro e fora do partido, porque estão sendo dadas sucessivas entrevistas para a imprensa dizendo que o PT já fechou acordo com o PMDB e que vai apoiar o candidato Pedro Paulo. Isto não são suposições. São fatos.

Agora, como eu disse, eu não tento impor nada. Expresso posições políticas e tento persuadir quem me lê mediante a exposição de argumentos que justificam estas posições. Não sei se você sabe, mas existe um negócio chamado "debate", que consiste no confronto de razões pró e contra uma determinada tese, por dois ou mais indivíduos que se posicionam sobre ela alternadamente. O debate começa com a apresentação de uma tese e tem curso com as sucessivas manifestações dos participantes, chamados debatedores, sobre a ideia inicialmente apresentada.

Este tipo de exercício, o debate - você deve lembrar dos nossos Anos de Chumbo aqui no Brasil - é algo inexistente nas ditaduras porque autoritários não suportam ser contrariados. Mas é uma prática que existe em todas as democracias, porque a democracia pressupõe exatamente a existência de espaço para a livre expressão da discordância. Na democracia a discordância é natural. Na ditadura a discordância é crime. Por isso toda democracia tem debate e por isso em toda ditadura o debate é proibido.

É evidente que a democracia tem outros pressupostos. Mas o espaço para discordar e para debater opiniões é sem dúvida nenhuma o pressuposto mais básico, aquele sem o qual nenhum país e nenhum partido podem se considerar realmente democráticos. Se o PT quer ser um partido democrático, então deve garantir espaço para a livre expressão das divergências entre os seus filiados e entre os filiados e a direção do partido, porque é assim que se formam os consensos que legitimam as decisões coletivas tomadas, porque é assim que se realiza a democracia partidária.

O debate, portanto, é fundamental para a realização da democracia partidária. E num partido de massas, como o PT, que tem mais de 1,7 milhão filiados, o debate democrático deve ser, necessariamente, público, porque senão será excludente. Poucos participarão e a maioria ficará de fora, à margem dos processos decisórios. E isto não é democracia.

Mas aqui nesta lista de e-mails nós sequer estamos num ambiente público. Só há e-mails de filiados. E ainda assim você quer coibir o debate sobre o processo eleitoral que já está em curso no país, com os candidatos sendo lançados e as alianças políticas sendo definidas. Me acusa de tentar impor minha posição, quando na verdade eu tento persuadir apresentando argumentos exatamente para que eles sejam contestados por quem discordar. E você não contestou nenhum dos argumentos que eu apresentei, só contestou a tese e até o direito de eu apresenta-la. E sou eu quem tenta impor?

E mais uma vez, como aconteceu no caso da companheira Eide, tenho que corrigir uma informação errada. O PSOL não pregou voto nulo no 2º turno da última eleição presidencial. O partido não  recomendou que seus eleitores votassem nulo e sim que não votassem em Aécio, para que não houvesse retrocesso. Ou seja, o PSOL reconheceu que houve avanços nos governos petistas e que um governo petista é melhor do que um governo tucano. A posição do partido, portanto, foi quase que uma autocrítica, na prática, dos exageros e dos equívocos dos anos anteriores.

O trecho da resolução do PSOL que definiu a posição do partido no 2º turno da última eleição, diz o seguinte:
"Um segundo turno, quando não nos sentimos representados nele, é muitas vezes mais do veto que do voto.

Entendemos que Aécio Neves, o seu PSDB e aliados são os representantes mais diretos dos interesses da classe dominante e do imperialismo na América Latina.

O jeito tucano de governar, baseado na defesa das elites econômicas e nas privatizações, com a corrupção daí decorrente, significa um verdadeiro retrocesso.

A criminalização das mobilizações populares e dos pobres empreendida pelos governos tucanos, em especial o de Alckmin, nos coloca em oposição frontal ao projeto do PSDB e aliados de direita.

Assim, recomendamos que os eleitores do PSOL não votem em Aécio Neves no segundo turno das eleições presidenciais. Não é cabível qualquer apoio de nossos filiados à sua candidatura."
Esta não é uma posição neutra, o PSOL tomou partido, mostrou que tinha uma preferência e que esta preferência era a candidatura da Dilma. Senão teriam dito "não votem na Dilma, nem votem no Aécio, anulem o voto". Mas não foi isso que fizeram. A resolução deu ao filiado e ao eleitor psolista duas opções: o voto nulo ou o voto em Dilma. Mas todas as principais figuras públicas do PSOL recomendaram o voto em Dilma, inclusive a candidata derrotada, Luciana Genro.

A bancada o PSOL na Câmara Federal, através do deputado Chico Alencar, fez na tribuna o seguinte registro:
"Sr. Presidente, e todo(a)s o(a)s que assistem a esta sessão ou nela trabalham.

Registro, nos Anais da Casa, a posição tomada de forma coletiva por nós, Deputados Federais do PSOL, no segundo turno das eleições presidenciais, nos marcos da Resolução Nacional do partido sobre o assunto.

(...)

6. Diante da composição de forças políticas e sociais que se constituiu, com os vínculos entusiasmados dos setores mais conservadores e retrógrados com a candidatura tucana, e do retrocesso que isso pode representar, dentro dos marcos aprovados pelo PSOL em Resolução divulgada em 8/10, declaramos nosso voto em Dilma;

(...)

Brasília, 10 de outubro de 2014.

Edmílson Rodrigues (PA)

Chico Alencar (RJ)

Jean Wyllys (RJ)

Ivan Valente (SP)

DEPUTADOS ELEITOS PELO PSOL"
E o deputado estadual Marcelo Freixo gravou até um vídeo que passou no programa eleitoral da Dilma, pedindo voto prá ela. Será que ninguém viu? Eu vi e prá quem tava distraído ou esqueceu, o link é esse aqui embaixo.

Marcelo Freixo apoiou Dilma no 2º turno

https://www.youtube.com/watch?v=on3oysCoxj8
Portanto não é verdade que o PSOL pregou voto nulo nesta eleição, nem é verdade que o PSOL defendeu o impeachment da Dilma, como disse a companheira E., e eu já provei para ela que é falsa esta informação. Isto são boatos, recurso típico das disputas políticas menos éticas. O PT mesmo é vítima frequente de mentiras como estas, que são deliberadamente espalhadas com o objetivo de manipular a opinião dos incautos. A unidade da esquerda brasileira não interessa à direita, mas também não interessa aos sectários e aos oportunistas da própria esquerda.

Enfim, trabalho de militante não é só participar de reunião e campanha eleitoral. Trabalho de militante é também se informar e pensar para informar e fazer pensar. Tem gente que acha isso uma chatice inútil, que legal mesmo é esperar a ordem do chefe e obedecer sem pensar, como na ordem unida dos exércitos. Pois é, nos exércitos é assim. Mas num partido realmente democrático o chefe expressa o desejo da maioria e não o contrário. E a verdade é que o PT não se propõe a ser um exército, se propõem a ser um partido democrático. Aí tem que ter debate mesmo, tem que ter espaço para que se expressem as discordâncias. Foi assim no começo. A falta de hábito é que fez com que alguns petistas esquecessem disso.

Silvio Melgarejo

31/01/2016

***
Abaixo, a mensagem da companheira S. a que este post se refere.
"Oi Silvio, De fato não tinha lido, porque entrei no papo em resposta a um post do M. Z., como você poderá ver abaixo. Mas concordo com você, embora não consiga acreditar numa aliança entre PT e PSOL. Todos os psolistas que conheço são ex-petistas e nutrem um ódio descomunal ao PT e ao Lula. O discurso deles não é nem um pouco diferente dos da Veja e Globo. Exceto o Jean Willys, que nunca foi do PT, os demais preferem atacar os governos petistas do que os governos tucanos, por isso, desconfio dessa ‘esquerda’. Pregaram voto nulo na eleição da Dilma x Serra e reeleição contra Aécio. Isso significa que não consideram os governos petistas nem uma gota melhor do que os governos tucanos, o que eu considero uma total e completa loucura.
 Também não considero aceitável que, numa lista do partido, se faça apologia a uma aliança sem que o partido tenha definido seu apoio, por mais que se julgue que apoiará o PMDB. E isso já é uma reincidência porque aconteceu na eleição passada. Esse papo de “PT deve apoiar” é para mim inaceitável. Sugira, mas não tente impor...
 
Acho que a aliança com o PMDB nunca foi uma preferência do PT, Lula e Dilma. Nem mesmo do Dirceu que a defendia antes dela acontecer, no 1º mandato do Lula. Mas o PT + PCdoB + PSOL não dão governabilidade ao governo Federal, e o PSB, antigo aliado, hoje é um partido de direita, tal como a tal de Rede e o finado partido comunista do Roberto Freire. E infelizmente, são realidades que não podem ser ignoradas... 
S."

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