domingo, 19 de junho de 2016

Apoio de Dilma ao plebiscito é sentença de morte do golpe e uma chance para sua permanência.

A luta contra o golpe, que parecia perdida, ganhou, semana passada, uma nova perspectiva de desfecho com a sinalização da presidenta Dilma Rousseff de que aprova e apoia a convocação de um plebiscito sobre a antecipação da eleição presidencial. Em entrevista ao jornalista Luís Nassif, gravada no dia 5, domingo, e levada ao ar na noite de quinta-feira, 9, Dilma declarou:
- "A consulta popular é o único meio de lavar e enxaguar essa lambança que está sendo o governo Temer."
À certa altura, perguntou-lhe Luís Nassif:
- "Presidente, um dos pontos centrais que tem sido colocados por muita gente é o seguinte: o que dificulta a queda do impeachment é não saber o que vai ser o dia seguinte. Suponhamos, então, que o impeachment caia no senado; como é que seria o dia seguinte?"
Dilma respondeu:
- "Eu acho que nós teremos, no dia seguinte, de, primeiro... porque tem um problema, né, Nassif: rompeu-se um pacto. Um pacto que vinha desde a constituição de 88 foi rompido. Você tem que remontar esse pacto. E eu não acredito que se remontará esse pacto dentro de gabinete. Então você terá que ter um processo em que a população vai ter, querendo ou não, que ser consultada. Eu acredito nisso. Acho que é impossível você refazer um pacto rompido, na proporção que foi... Agora, acho que é fundamental, para que esse pacto seja passível de ser executado, que haja o fim do golpe. Significa que nós ganhemos no senado. Eu não acho possível fazer pacto nenhum com o governo Temer em exercício."
O pacto rompido, a que Dilma se refere, foi o pacto de respeito às regras do jogo democrático, expressas na Constituição. Era esse pacto que vinha permitindo a manutenção de um certo nível de justiça e civilidade nas disputas políticas do país, conferindo-lhes alguma legitimidade democrática e possibilitando os avanços sociais alcançados no período da sua vigência.

Com a tentativa de golpe de Estado, este pacto foi rompido e o país posto ante à possibilidade real de retrocesso à barbárie dos regimes ditatoriais, experimentada tantas vezes ao longo da sua história.

Dilma, que traz no corpo e na alma a memória da última ditadura brasileira, sabe muito bem o custo que um novo mergulho como aquele, na treva, poderia ter para a nação. Por isso anuncia agora a decisão de priorizar a recomposição do pacto nacional de respeito à Constituição, antes que ao direito de exercer integralmente o seu mandato.

Admite a redução do mandato. Mas desde que o povo, e só o povo, assim decida soberanamente por meio do voto, num plebiscito.

Deve saber a presidenta do grau de rejeição que sofrem na sociedade tanto ela, quanto seu vice, e do desejo da maioria dos trabalhadores de eleger, o quanto antes, um novo presidente da república, que revitalize as suas esperanças num futuro melhor.

Tendo claro que o objetivo de qualquer golpe de Estado não é reduzir o mandato do presidente da república e sim tomar a presidência de assalto, entende-se que a derrota de um golpe não se dá apenas quando impedida a redução do mandato, mas também quando se impede a tomada do poder presidencial.

Quando não for possível evitar a redução do mandato, ainda pode ser possível derrotar um golpe barrando a tomada do poder. Dilma entendeu isto.

Entendeu, sobretudo, que o que está em jogo no Brasil hoje não é apenas o seu direito de governar, é a democracia do país.

E entendeu que confiando o destino do seu mandato ao povo, que o concedeu, poderá não só derrotar o golpe, impedindo a tomada do poder pelos golpistas, como salvar a democracia e até mesmo receber do povo uma nova chance, para governar até 2018.

Para ser aprovado, o impeachment precisa ter os votos de 2/3 dos senadores. Como o senado tem 81 membros, são necessários pelo menos 54 votos favoráveis para aprovar o impeachment.

Isto significa que para derrotá-lo são necessários pelo menos 28 votos não favoráveis, que podem ser tanto votos contrários ao impeachment, quanto abstenções e ausências.

E, ao que tudo indica, estes votos não favoráveis já existem.

Deve-se a isto, com certeza, a mudança súbita de humor da mídia em relação a Temer esta semana. Ele deixou de ser útil para a direita, porque está com os dias contados para deixar a presidência e dar lugar a Dilma Rousseff.

E como se deu essa virada de jogo?

No dia 19 de abril, 30 senadores protocolaram na mesa do senado uma Proposta de Emenda Constitucional pedindo a antecipação da eleição presidencial.

Destes 30 senadores, 22 votaram contra a admissibilidade do processo de impeachment, na sessão de 11 de maio.

8 votaram a favor, com a ressalva de alguns de que o fato de admitirem a abertura do processo não significava que já estivessem decididos a votar a favor do impeachment.

Se estes 8 senadores decidissem votar contra a aprovação do impeachment, o golpe estaria derrotado. Mas o que poderia levá-los a votar contra o impeachment?

A meu ver, três fatores.

A convicção quanto à inocência de Dilma, uma opinião pública muito desfavorável sobre o governo provisório de Temer e um acordo com a presidenta para a antecipação da sua sucessão.

Pois a inocência de Dilma já foi cabalmente comprovada, a rejeição a Temer na sociedade tem se mostrado altíssima e crescente e a presidenta finalmente concordou em antecipar sua sucessão, desde que seja este o desejo do povo, manifestado por meio do voto, num plebiscito.

Isso tudo permitiu que Dilma e os 30 senadores chegassem a um acordo que consiste no seguinte:
1 - os 30 senadores votam contra o impeachment e derrotam o golpe;

2 - Dilma reassume o mandato e defende a realização de um plebiscito sobre a antecipação da eleição presidencial; e

3 - os 30 senadores aprovam a convocação do plebiscito, que é possível com 27 votos (1/3 do senado, que tem 81 membros).
A derrota do golpe no senado e o plebiscito não só contribuirão para a recomposição do pacto nacional de respeito à democracia e à Constituição, como criarão novas perspectivas para a esquerda brasileira e para o próprio governo Dilma, cujas chances de recuperação mostravam-se nulas até o acordo com os senadores.

Se o "Fora Temer" tem crescido porque crescem as expectativas negativas sobre o governo dele, o "Fica Dilma" pode também crescer e acabar se impondo no plebiscito, se Dilma conseguir criar, no curto espaço de tempo entre a restituição do seu mandato e o dia do plebiscito, as melhores expectativas possíveis sobre o futuro do seu governo, caso lhe seja concedida a chance de continuar na presidência até 2018.

O plebiscito de 2016 seria na verdade a terceira eleição presidencial de Dilma Rousseff, desta vez postulando junto ao povo o direito de exercer integralmente o mandato que o próprio povo lhe concedera em 2014.

A vitória do NÃO à antecipação da eleição presidencial seria na prática mais uma reeleição de Dilma e a recomposição de um outro pacto, o pacto entre a presidenta e seus eleitores de 2014, rompido por ela própria quando abandonou o programa de governo para o qual havia sido eleita.

Mas se não houver tempo para reconquistar a confiança do povo e Dilma perder a disputa, com a vitória do SIM à antecipação da eleição presidencial, deve a esquerda enfrentar este novo desafio confiante, porque o campo de disputa política que mais favorece a uma vitória sobre a direita hoje não é o do parlamento, do judiciário ou das ruas, é exatamente o campo do debate público programático, possibilitado por uma campanha eleitoral.

O povo não quer o programa de governo da direita, já deixou isso claro em quatro eleições presidenciais consecutivas e dirá não a este programa toda vez que ele lhe for apresentado.

Programas de austeridade serão sempre derrotados nas urnas e só poderão ser implementados por regimes políticos autoritários.

Por isso a direita precisa tanto do golpe, para evitar o crivo das urnas e para conquistar o controle absoluto do aparato repressivo do Estado, que lhe permitiria esmagar a resistência popular nas ruas à implementação do seu programa.

Tudo que a direita menos quer hoje é submeter sua permanência no governo à vontade popular esclarecida pela visão do confronto entre o seu programa e o programa da esquerda, num debate público.

Não é atoa que Globo, Temer, Jucá e Geraldo Alckmin já se manifestam contra à antecipação da eleição presidencial e até ao plebiscito, dizendo que "isto, sim, seria golpe".

Pois as razões que os levam a rejeitar o caminho acordado entre Dilma e os 30 senadores liderados por Roberto Requião são as mesmas que devem animar a esquerda toda a tomar posição oposta, de apoio à consulta popular, através de um plebiscito.

Não só porque permite a conquista dos votos necessários para derrotar o impeachment no senado, mas também porque leva a disputa política para o campo que mais favorece à esquerda, em qualquer circunstância, que é o campo do debate público programático.

Eleições e plebiscitos são momentos de reflexão e decisão coletivas, de acerto de contas e assunção de compromissos que vinculam, nos regimes democráticos, a ação dos governantes à vontade popular.

A esquerda não tem razão nenhuma para temer o julgamento da classe trabalhadora, nem  para duvidar do seu discernimento político ante um debate sobre programas de governo.

Afinal, foi este discernimento que elegeu Dilma presidente e não uma improvável empolgação de 54 milhões de cidadãos com a retórica e carisma da nossa candidata.

Há muita luta pela frente e o PT deve se preparar melhor para enfrentá-las. Mas há também razões para otimismo quanto aos desdobramentos imediatos da batalha do impeachment, que é apenas mais um episódio da luta histórica dos trabalhadores contra a opressão capitalista.

Fora Temer!

Plebiscito Já!

O povo decide quem governa.

Silvio Melgarejo

19/06/2018

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