Como era o PT e como ele gostaria de ser nos anos 80?
Resolução política do 5º Encontro Nacional, de 1987:
Uma história que precisa ser relembrada.
Aos que acreditam que o PT algum dia já foi um partido organizado, em que uma rede de diretórios e núcleos de base garantia a democracia interna e a poder de ação coordenada dos filiados nas ruas, convém ler o capítulo sobre Construção Partidária da Resolução Política do 5º Encontro Nacional do PT, de 1987.
Exatamente na época que muitos têm como a fase áurea do PT, em que a democracia interna do partido foi mais viva, saudável e vigorosa, a maioria dos delegados eleitos para aquele encontro - muito antes da invenção do PED - aprovou um texto que desmente tudo isso, descrevendo o seguinte quadro (vejam bem, esta era a situação do PT em 1987):
"Hoje, estão evidentes as limitações de nossa organização, de nossas instâncias e quadros dirigentes. A cada dia que passa, aumentam as tarefas e cresce nossa base social, mas a nossa estrutura não corresponde às necessidades da luta política.Vejam bem, companheiros. O texto que vocês acabaram de ler foi aprovado pela instância máxima do PT, que é o Encontro Nacional, no longínquo ano de 1987. Tão antigo e, no entanto, tão atual.
Por vezes, caímos no espontaneísmo e subestimamos a formação política e a teoria. No anseio de criar um partido aberto, democrático e de massas, deixamos num segundo plano a organização de suas instâncias. (...)
Dessa forma, apesar da enorme influência do PT nos movimentos sociais – popular, sindical, camponês, de mulheres e estudantil –, milhares de militantes ainda permanecem alheios às suas instâncias organizativas. Com isso, privam-se da discussão e da vida partidária, e obstaculizam a sua evolução para uma militância política conseqüente e uma consciência política socialista. (...)
O PT está confrontado com a necessidade de uma revolução na sua organização, e tem os meios para isto – sobretudo a sua base social. Mas, para que possamos definir um plano de organização claro, é indispensável revermos algumas idéias difundidas no Partido, que fazem parte da nossa cultura petista, mas que não correspondem às nossas necessidades atuais. (...)
Atualmente, nossos núcleos de base são poucos e, na maioria das vezes, precários, havendo uma enorme distância entre os nossos desejos e a realidade. (...)
Os núcleos estão abandonados. Devemos reconstruí-los como a principal base e característica do Partido. Continuamos vivendo uma crise organizativa no PT. Os núcleos, mais do que nunca, estão desprestigiados. Entendidos desde o início como a principal base e característica do Partido, têm enfrentado sérias dificuldades para se generalizarem e se constituírem em organismos de massa. Não raro, a maioria deles fica voltada para questões de ordem interna – sem refletir os interesses das comunidades ou das categorias a que se vinculam – e, portanto, sem atrair novos participantes. (...)
Um aspecto a ser observado é a carência de informação política dos militantes. Outro ponto de estrangulamento é a nossa fragilidade econômica, tendo implicações desde a questão da imprensa partidária ao fechamento de sedes de núcleos e Diretórios.
Chegamos a tal ponto não por descuido ou acidente de percurso. A fragilidade das estruturas orgânicas do PT teve início na campanha eleitoral de 1982, quando diluímos nossos núcleos e Diretórios em comitês eleitorais de candidatos que, em sua maioria, terminaram em 15 de novembro daquele ano, com o fim da campanha. De lá para cá, o PT encaminhou com relativo êxito algumas campanhas gerais, porém, até hoje, não conseguiu formular nem implementar uma política de organização que estimulasse o crescimento do Partido do ponto de vista orgânico (nucleação, formação política, finanças etc.). Essa fragmentação tem muito a ver com a postura que se tomou em relação à construção partidária. Mais que isto, tem a ver com a visão do papel do Partido que estamos construindo."
Segue, abaixo, o capítulo da Resolução do 5º Encontro Nacional do PT, realizado em 1987, sobre Construção Partidária, em que se vê claramente que a precaridade do funcionamento dos diretórios e núcleos de base é um problema muito mais antigo do que a maioria pensa.
Importante destacar que esta resolução aponta os problemas, mas também busca suas causas e recomenda soluções, que o PT, infelizmente, nunca levou efetivamente a sério. Por isso, por falta de tratamento, a crise organizativa que a resolução diz ter se iniciado em 82, quando o PT participou de sua primeira eleição, se tornou crônica e compromete o funcionamento do partido até os dias de hoje. É hora de os petistas retomarem essa discussão, relembrando os seus antecedentes históricos.
Vamos ler, reler e refletir sobre a resolução do 5º Encontro. É a proposta que faço aos filiados e filiadas do Partido dos Trabalhadores. O que há em comum entre o que o PT era e gostaria de ser em 1987 e o que o PT é e gostaria de ser em 2015? Ainda temos os mesmos objetivos, a mesma estratégia de luta e aquela mesma concepção de partido? Vamos pensar.
Silvio Melgarejo
30/03/2015
Resolução do 5º Encontro Nacional (1987)
A CONSTRUÇÃO DO PT
196. É chegado o momento de transformar o PT e dar um salto de qualidade em sua organização. Avançar na sua construção como Partido dos Trabalhadores significa aprofundar seu caráter de partido de classe, democrático, de massas e socialista.
197. Durante estes anos, todo trabalho organizativo do Partido dirigiu-se para a garantia de sua existência (campanha de filiação, organização legal dos Diretórios); para o apoio às lutas políticas e sociais e a construção da CUT; e para a luta eleitoral (disputa das eleições de 1982, 85 e 86). Tratava-se de implantar o Partido, legalizá-lo, travar a luta contra a Ditadura (luta contra a LSN [Lei de Segurança Nacional], luta contra os pacotes econômicos, luta pelas diretas) e apoiar a luta sindical e popular.
198. Hoje, o Partido é uma realidade. Tem bases sociais e eleitorais, com caráter nacional e uma força política, e tem capacidade própria de mobilização social. Atua no Parlamento e se expressa no campo institucional com propostas e programas, como ficou patente na Constituinte e nas disputas de governo. Levantou a bandeira da luta contra a Nova República com a campanha Contra Sarney e a Dívida, Diretas-Já. É uma alternativa real de organização partidária de classe dos trabalhadores, com identidade política definida e socialista.
199. Contudo, rodeados pela política burguesa, pela legislação partidária e eleitoral e por nossas próprias condições (nível de luta e consciência do movimento sindical e popular, dos dirigentes e lideranças; escassos recursos materiais; diferentes visões sobre o Partido, [sua] construção e a luta política do País), cometemos muitos erros e não fomos capazes de dar a devida atenção às tarefas que a construção do PT exige.
200. Hoje, estão evidentes as limitações de nossa organização, de nossas instâncias e quadros dirigentes. A cada dia que passa, aumentam as tarefas e cresce nossa base social, mas a nossa estrutura não corresponde às necessidades da luta política.
201. Por vezes, caímos no espontaneísmo e subestimamos a formação política e a teoria. No anseio de criar um partido aberto, democrático e de massas, deixamos num segundo plano a organização de suas instâncias.
202. A estrutura organizativa do PT, em comparação com os partidos tradicionais da política brasileira, apresenta-se muito mais dinâmica e democrática, sem dúvida alguma. Os mecanismos de participação abertos ao conjunto dos filiados (Encontros Nacional, Regionais, Municipais e Distritais; núcleos, plenárias, seminários etc.) permitem um partido muito mais afeito às discussões de base do que os partidos tradicionais.
203. No entanto, a atual estrutura do PT ainda representa uma organização fundamentalmente internista. As lideranças petistas dos movimentos sociais organizam-se no interior dos próprios movimentos de que participam, mas têm pouca ou nenhuma participação orgânica no interior do PT. É verdade que isso se dá, bastante, pelo fato desses militantes ficarem presos, a maior parte do tempo, na dinâmica dos próprios movimentos, mas essa não é a única explicação. A outra razão é que a atual estrutura do PT não é ágil para discutir a política que esses mesmos militantes devem levar para a sua atuação dentro dos movimentos sociais de que participam. E confundimos, muitas vezes, autonomia e independência dos movimentos sociais com ausência de propostas políticas e direção.
204. Dessa forma, apesar da enorme influência do PT nos movimentos sociais – popular, sindical, camponês, de mulheres e estudantil –, milhares de militantes ainda permanecem alheios às suas instâncias organizativas. Com isso, privam-se da discussão e da vida partidária, e obstaculizam a sua evolução para uma militância política conseqüente e uma consciência política socialista.
205. É urgente desenvolver a Secretaria Agrária Nacional e implantar as Secretarias Agrárias Regionais, para concretizar e viabilizar o PT na área rural, ampliando a participação dos trabalhadores rurais (assalariados, pequenos produtores, assentados e sem-terra) nas instâncias partidárias, para desenvolver-se como instância de elaboração de políticas para o PT na área rural; para aprofundar a discussão sobre o caráter do desenvolvimento do capitalismo no campo e o papel dos trabalhadores rurais nas transformações sociais; para assessorar os parlamentares do PT no trabalho junto aos rurais; para participar da discussão das plataformas municipais e estaduais.
206. O PT está confrontado com a necessidade de uma revolução na sua organização, e tem os meios para isto – sobretudo a sua base social. Mas, para que possamos definir um plano de organização claro, é indispensável revermos algumas idéias difundidas no Partido, que fazem parte da nossa cultura petista, mas que não correspondem às nossas necessidades atuais.
PARTIDO COMO REFLEXO E DIREÇÃO
207. Já o Manifesto de Fundação do PT dizia: “O PT pretende ser uma real expressão política de todos os explorados pelo sistema capitalista”. Também, desde o início da nossa construção, afirmamos o nosso respeito à autonomia dos movimentos sociais. Essas duas idéias são corretas, e desempenharam um papel importante, na medida em que esclarecem nossa vontade de construir um partido profundamente enraizado nos movimentos, nas lutas populares e, ao mesmo tempo, capaz de um grande respeito à sua autonomia, avesso a qualquer política de aparelhismo.
208. Contudo, na cultura política petista, passamos muitas vezes a ideia de que o PT deveria ser o reflexo dos movimentos sociais, representante desses movimentos no plano político – o que termina significando representante no plano institucional e parlamentar. No extremo, o PT seria uma espécie de braço parlamentar do movimento sindical ou dos movimentos populares. O PT não poderia querer dirigir as lutas dos movimentos sociais, pois assim estaria desrespeitando a sua autonomia.
209. Esta concepção é incorreta e confusa. Na verdade, se lutamos por um partido capaz de ser um instrumento real de luta pelo socialismo, esse partido tem de ser capaz de dirigir essa luta, de apontar seus rumos. Terá de se tornar o dirigente político dos trabalhadores. Para nós, trata-se de, respeitando a democracia dos movimentos, suas instâncias e características, disputar sua direção com propostas previamente debatidas nas instâncias do PT, articulando nossa atuação de luta sindical e popular com a construção partidária e nossa estratégia de luta pelo poder.
210. Fora disso, cairemos no espontaneísmo, nas lutas setoriais dispersas, de um lado, e no ativismo parlamentar, do outro. Corremos o risco de assistir a explosões sociais desorganizadas, com dificuldades de serem canalizadas para a transformação social revolucionária.
PARTIDO DE QUADROS E PARTIDO DE MASSAS
211. Outra ideia profundamente equivocada que costuma aparecer em nossos debates é a que opõe partido de quadros a partido de massas. Para essa confusão contribui, também, a cultura tradicional da esquerda, que em geral teve uma visão estreita da ideia leninista de partido de vanguarda.
212. Se exagerarmos a dicotomia, temos de um lado um partido de quadros pequeno, estreito, sectário, formado de militantes, baluartes que tudo decidem e dirigem, e de outro um partido de massas frouxo, inorgânico, sem cotizações regulares, cada um fazendo o que bem entende e chamando filiados para fazer número em convenções, como qualquer partido burguês.
213. Se queremos um partido capaz de dirigir a luta pelo socialismo, não precisamos nem de uma coisa, nem de outra. Precisamos de um partido organizado e militante, o que implica a necessidade de quadros organizadores. Um partido que seja de massas porque organizará milhares, centenas de milhares ou até milhões de trabalhadores ativos nos movimentos sociais, e porque será uma referência para os trabalhadores e a maioria do povo.
214. Nossa concepção, portanto, é a de construir o PT como um partido de classe dos trabalhadores, democrático, de massas e socialista, que tenha militância organizada e seja capaz de dirigir a luta social. É a partir dessa concepção que indicamos algumas medidas necessárias no plano organizativo.
A ORGANIZAÇÃO NA BASE
215. A questão da organização na base do Partido é uma das mais sérias que enfrentamos. Todos nós já passamos pela experiência de filiar um companheiro ao Partido e depois não sabermos o que propor como forma de participação do novo filiado. A falta de participação organizada na base leva a grandes problemas: a tendência à separação entre a intervenção nos movimentos sociais (onde os petistas atuam desorganizados ou organizados apenas nas entidades do movimento de massas) e a tendência ao distanciamento entre a direção do Partido e sua base. Para enfrentar essa situação, temos de repensar nossas formas de organização na base, melhorá-las e ampliá-las.
OS NÚCLEOS DE BASE
216. Segundo a nossa concepção, os núcleos de base devem ser a forma fundamental de organização do Partido. Cabe-lhes o papel de organização dos militantes para construir o PT, filiando e preparando trabalhadores para a militância partidária, procurando desenvolver sua capacidade de direção e mobilização política no setor em que atuam. Os núcleos deveriam ser, além disso, um canal de participação da militância nos debates e na definição do conjunto da política do PT, constituindo, portanto, um organismo de poder no Partido, aprofundando e garantindo a sua democracia interna. Os núcleos devem, desta forma, realizar a unidade da intervenção partidária, seja no nível do setor específico em que atuam, seja no nível das campanhas e questões de interesse em que todo o Partido deve se empenhar.
217. Em nossa concepção, os núcleos podem se organizar de acordo com a frente de atuação dos petistas, ou seja, por local de moradia, categoria profissional, local de trabalho ou de estudo e por movimentos sociais. Essa concepção é correta, sendo necessário apenas dar-lhe um caráter amplo: qualquer frente de atuação dos petistas pode ser a base para a formação de um núcleo, exceto por identificação política com tendência do Partido.
218. Atualmente, nossos núcleos de base são poucos e, na maioria das vezes, precários, havendo uma enorme distância entre os nossos desejos e a realidade. As razões disso são inúmeras: a pouca experiência política da maioria dos militantes petistas (o que é próprio de um partido em construção e que cresce rapidamente); de quadros organizadores; a falta de infra-estrutura para o funcionamento dos núcleos (o que nos remete à questão das finanças); a falta de maior formação política; os entraves que vêm da legislação partidária herdada da Ditadura, e que se expressam no nosso Regimento (que, na verdade, termina priorizando os Diretórios com relação aos núcleos). O funcionamento regular dos núcleos deve ser estimulado e assistido pelos órgãos de direção, que devem tanto propor orientações políticas e propostas de atividades, quanto acompanhar essas atividades. Além disso, esse funcionamento regular exige uma alimentação constante pela imprensa do Partido, única forma de propiciar uma discussão política mais rica. Um jornal de massas é indispensável.
219. Os núcleos estão abandonados. Devemos reconstruí-los como a principal base e característica do Partido. Continuamos vivendo uma crise organizativa no PT. Os núcleos, mais do que nunca, estão desprestigiados. Entendidos desde o início como a principal base e característica do Partido, têm enfrentado sérias dificuldades para se generalizarem e se constituírem em organismos de massa. Não raro, a maioria deles fica voltada para questões de ordem interna – sem refletir os interesses das comunidades ou das categorias a que se vinculam – e, portanto, sem atrair novos participantes. Além disso, constata-se que vários petistas com posição de destaque no movimento sindical e popular não mantêm uma militância propriamente partidária, estando afastados de nossa estrutura orgânica. Os Diretórios, em geral, vivem da combinação de discussão sobre as questões internas do PT com o encaminhamento das campanhas gerais do Partido. Poucos são aqueles que conseguem articular essas tarefas com o impulsionamento e a direção do movimento social e a formulação de políticas alternativas no âmbito de sua atuação.
220. Um aspecto a ser observado é a carência de informação política dos militantes. Outro ponto de estrangulamento é a nossa fragilidade econômica, tendo implicações desde a questão da imprensa partidária ao fechamento de sedes de núcleos e Diretórios.
221. Chegamos a tal ponto não por descuido ou acidente de percurso. A fragilidade das estruturas orgânicas do PT teve início na campanha eleitoral de 1982, quando diluímos nossos núcleos e Diretórios em comitês eleitorais de candidatos que, em sua maioria, terminaram em 15 de novembro daquele ano, com o fim da campanha. De lá para cá, o PT encaminhou com relativo êxito algumas campanhas gerais, porém, até hoje, não conseguiu formular nem implementar uma política de organização que estimulasse o crescimento do Partido do ponto de vista orgânico (nucleação, formação política, finanças etc.). Essa fragmentação tem muito a ver com a postura que se tomou em relação à construção partidária. Mais que isto, tem a ver com a visão do papel do Partido que estamos construindo.
222. As campanhas gerais de intervenção na conjuntura, se por um lado aumenta as simpatias pelo PT, por outro lado, dissociadas de uma correta política de construção partidária, não conseguiram traduzir-se em aumento do nível de organização e enraizamento do PT na realidade social. Ocorre, por vezes, o inverso, ou seja, o Partido geralmente sai das campanhas mais disperso e desorganizado, portanto, mais fraco para resistir a novos avanços da burguesia. O esforço de intervenção na conjuntura, por meio de campanhas gerais, não foi acompanhado por uma política clara de reforço, politização e expansão da nucleação. O resultado foi a drenagem de forças e elementos para ações gerais e conjunturais, levando a um colapso a estrutura dos núcleos e Diretórios. É necessário um esforço consciente e priorizado para que os núcleos construam e ocupem o seu espaço na vida orgânica do partido e nas lutas sociais.
223. Uma política de nucleação, portanto, exige medidas em todos estes níveis:a) Em primeiro lugar, de formação política, de transmissão da experiência militante. Ligada a isso, uma campanha de esclarecimento sobre o caráter do Partido, sobre as necessidades de funcionamento de um partido que se propõe, como o PT, a lutar pelo socialismo (o que inclui a discussão sobre a necessidade de um partido dirigente), sobre o fato de que o partido de massas deve ser também de militância e de quadros, sobre a relação entre partido e movimentos sociais. É preciso que façamos uma verdadeira campanha no sentido de ganhar os petistas para a ideia da importância de organizar os núcleos.
b) Uma política de nucleação deve ser acompanhada de uma política de finanças que lhe possibilite ter sua própria infra-estrutura. O êxito da nucleação exigirá uma mudança de conjunto no funcionamento do Partido, uma direção capaz de dirigir politicamente e de assistir as bases, de alimentar a militância com uma imprensa ágil e diversificada. Há necessidade de mudanças no Regimento Interno, que valorizem os núcleos, dando a eles maior poder na estrutura do Partido. Duas medidas são positivas: formar conselhos de núcleos, junto aos Diretórios Municipais e Zonais e dar aos núcleos uma representação direta nos Diretórios (formando Diretórios Ampliados, que incluiriam um certo número de representantes eleitos diretamente pelos núcleos; 1/3 do número de membros efetivos e suplentes eleitos nos Encontros dos Diretórios).
224. O núcleo deve ter características de massa e de vanguarda. É fundamental essa convivência dentro dos núcleos. Há momentos em que os núcleos atraem o maior número possível de simpatizantes e filiados para suas decisões e atividades de massa. Essas reuniões só serão possíveis e só terão conseqüência se estiverem vinculadas a outras reuniões, voltadas ao aprofundamento político e de como os militantes devem intervir no ambiente em que o núcleo está inserido.
225. O aprofundamento político com um grupo mais restrito de companheiros não se confunde com a prática da célula tradicional. Primeiro, porque visa referenciar as decisões dos núcleos nas necessidades colocadas pelos movimentos sociais; segundo, porque são reuniões abertas à participação de quem quiser, sem qualquer triagem. Assim, os núcleos teriam funções formadoras de intervenção no seu meio e de deliberação em conjunto com os Diretórios.
226. A construção do PT deve priorizar a nucleação dos filiados e militantes, a assistência aos núcleos de base já existentes e a criação de novos núcleos. Os núcleos devem desenvolver ações internas e externas:a) internas: de planejamento, distribuição de tarefas entre os militantes, avaliação das tarefas, formação e elaboração política;
b) externas: de ampliação das políticas planejadas, divulgação, agitação, debates etc., para amplas massas.227. Os núcleos por local de moradia devem ter como objetivo a hegemonia política e ideológica na sua área de atuação, desenvolvendo as seguintes tarefas:a) cadastrar os militantes e filiados por categorias profissionais, orientar politicamente e organizar seus companheiros nos locais de trabalho, visando ganhar para o campo da CUT o seu sindicato, se este ainda não for nosso;
b) mapear os movimentos sociais existentes em sua área, definir, com base nas orientações gerais do Partido, políticas específicas para cada um desses movimentos. Levantar as demandas sociais existentes que não tenham movimento tratando delas, fazer a crítica política a respeito, organizar debates e palestras com vistas a despertar interesse nos moradores para então organizar as lutas visando a solução dessas demandas;
c) tratar da formação política dos militantes, filiados e simpatizantes;
d) promover e divulgar a cultura popular, através da exibição de filmes, slides, festas, shows e eventos esportivos etc.;
e) cotizar os militantes e filiados, promover eventos para levantar recursos para o Partido, tendo em vista que a sustentação financeira do Partido é tarefa de todos os petistas;
f) tratar, de modo especial, os problemas da juventude, fazendo a ligação desses com a questão cultural, estudantil, familiar, de lazer etc.;
g) cuidar dos filiados novos, destacando no núcleo um ou mais militantes responsáveis pela formação política do conjunto do núcleo, para tratar de modo especial do engajamento dos novos filiados, transmitindo a estes as políticas gerais do Partido, os conceitos básicos dessas políticas, a estrutura orgânica, suas relações internas e com os movimentos sociais ou com a sociedade em geral – evitando, assim, a fuga dos novos filiados pelo desnível com os militantes mais antigos;
h) organizar mutirões de visita aos moradores de sua área, levando a estes a mensagem do PT e chamando-os para as atividades gerais do Partido e para o núcleo; planejar panfletagens e vendas da imprensa partidária em feiras, fábricas e unidades de serviço público.228. Os núcleos por categorias, por extrapolarem, em geral, as esferas municipais e zonais, devem ser implementados pelos Diretórios Regionais. Esses núcleos e os por local de trabalho e por movimentos sociais devem tratar, além de suas especificidades, das questões descritas acima, naquilo que couber.
229. O detalhamento descrito neste documento não basta para garantir a nucleação e o seu fortalecimento. É evidente que a realização de tais atividades com maior conteúdo e eficácia política só poderá se dar dentro de um esforço mais amplo de politização do conjunto partidário, e neste processo a nossa imprensa [deve] desempenhar um papel fundamental. Além disso, devemos organizar secretarias e comissões, nos Diretórios, que possam dar suporte e assistência sistemática aos núcleos e ao trabalho de nucleação.
230. A mudança de qualidade dos trabalhos dos Diretórios passa, também, pela realização de reuniões ampliadas e plenárias de filiados e pela criação dos conselhos de núcleos, conforme proposta de alteração do Regimento Interno.
231. Quanto a regiões e sub-regiões, deve ser apoiado o seu fortalecimento enquanto instâncias de integração, coordenação e aplicação da linha política do PT de forma integrada com os núcleos e Diretórios, facilitando o enraizamento do PT no movimento social, a formação e o debate político, bem como a aproximação das bases com a direção partidária. Se os núcleos devem ser entendidos como elementos de organização de base, de discussão e intervenção, os Diretórios, as sub-regiões e as regiões devem ser fortalecidas como elementos de centralização política e coordenação. Para tanto, é necessário que se aprofunde o conhecimento de sua realidade específica e se elaborem planos de trabalho estabelecendo prioridades para a atuação conjunta.
OUTRAS FORMAS DE ORGANIZAÇÃO DE BASE
232. Embora os núcleos sejam a forma mais importante de organização na base do Partido, não suprem todas as necessidades e não esgotam as possibilidades. Os núcleos são formas organizativas próprias para aqueles companheiros que têm uma militância política mais regular, mais constante. Haverá outros companheiros, filiados ao Partido, dispostos a formas de colaboração mais eventuais ou mais localizadas em alguma área.
233. Há formas organizativas eficazes, que já têm sido praticadas pelo PT e devem ser incorporadas de forma permanente à vida partidária:a) grupos de apoio (que se formam em determinadas campanhas e que têm, portanto, uma vida mais curta);
b) plenárias de militantes: a discussão e o encaminhamento por meio de plenárias é uma forma ágil de contato entre os órgãos de direção e o conjunto dos militantes. Propiciando o encontro de militantes de frentes de atuação distintas, contribuem também para a politização geral. As plenárias podem ser realizadas em vários níveis: estaduais, municipais, por região etc.234. Além disso, o PT deve avançar para ter um contato permanente com o maior número possível de filiados, inclusive os que não se dispõem a ter uma militância regular ou mesmo eventual. Essa ligação pode-se dar pela imprensa do Partido, em vários níveis, inclusive na imprensa local de núcleos, pelo convite para participar de plenárias e, naturalmente, pela solicitação de uma contribuição financeira para o Partido.
235. Todo militante petista que sofrer repressão policial em decorrência de atividade política deverá receber apoio jurídico da parte do PT.
CENTRALIZAÇÃO PARTIDÁRIA E FUNCIONAMENTO DA DIREÇÃO
236. Ao lado da precariedade de nossa organização na base do Partido, outro ponto de estrangulamento é a falta de uma real centralização do Partido, de unidade de ação por parte dos seus militantes. Para ser um partido dirigente, capaz de intervir de forma organizativa e coerente nos movimentos sociais, e de dar um rumo à luta das massas trabalhadoras pelo socialismo, o PT precisa de centralização.
237. Para que essa centralização contribua para o fortalecimento da democracia interna, é preciso empenho para agilizar meios que assegurem a democratização das informações e o processo de tomada de decisões em todos os níveis da estrutura partidária.
238. A capacidade de atuação centralizada envolve pelo menos três questões. Em primeiro lugar, a existência de definições políticas claras. Em segundo, a consciência, por parte da militância petista, da necessidade da centralização política do Partido. Em terceiro lugar, o funcionamento pleno das instâncias de direção partidária.
239. O funcionamento das nossas instâncias diretivas é extremamente precário, com a tendência dos Diretórios terem um caráter formal e a sobrecarregar as Comissões Executivas.
240. Precisamos, portanto, superar essas falhas, construindo uma verdadeira direção política. Isso implicará o funcionamento coletivo dos Diretórios, com a distribuição planificada e coletiva das tarefas e a responsabilização e cobrança do cumprimento das tarefas. Em vista das crescentes necessidades de desempenho prático das tarefas deliberadas, o PT também precisa definir uma política com relação à profissionalização dos dirigentes e dos funcionários.
241. Isso deve ser combinado com uma integração dos membros dos Diretórios nas diversas secretarias, comissões e grupos de trabalho (que são estruturas auxiliares da direção), deixando às Comissões Executivas seu papel próprio, de instâncias que têm enorme responsabilidade política, mas que são dirigidas pelo Diretório respectivo.
242. Além disso, precisamos conseguir que haja no Partido uma elaboração política mais coletiva, que unifique a intervenção dos militantes e instrumentalize o Partido com políticas claras para o movimento popular e sindical, integrando as distintas experiências. Nesse sentido, é preciso convocar encontros por área de atuação no movimento sindical e popular, precedendo os Encontros Regionais e Nacional, com poderes para deliberar políticas indicativas para os Encontros. Particularmente importante é que os membros dos órgãos de direção tenham todos tarefas organizativas, diretivas e de acompanhamento das organizações de base, em particular dos núcleos.
243. Entretanto, resolver o problema do funcionamento das direções implica, também, resolvermos corretamente duas questões-chave no processo de centralização do PT, o direito de representação proporcional nas Executivas e o direito de tendência. [FIM]
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.