O governo que Lula quer fazer
Lula tem dito de modo reiterado que só admite ser novamente presidente da república se for para fazer mais do que fez nos seus dois primeiros mandatos. Nas atuais circunstâncias, muito piores do que as enfrentadas por ele de 2003 a 2010, isto só será possível com um programa de governo bem mais arrojado que o daquele tempo. Mais arrojado significa mais à esquerda e mais à esquerda significa antineoliberal. Isto porque a razão maior da tragédia que está em curso no Brasil hoje é exatamente a política econômica neoliberal, que já penalizava o povo durante o governo Temer e que durante o governo Bolsonaro impôs ao povo um sofrimento ainda maior, na medida em que teve os seus piores efeitos agravados pela epidemia.
O sofrimento do povo hoje é enorme e por isso o povo quer alívio rápido, algo que só será possível com mudanças rápidas e efetivas na política econômica do país. De modo que, se não for orientado desde o começo por um programa radicalmente antineoliberal, o próximo governo Lula tende a ser um enorme fracasso; a economia continuaria estagnada, a crise social aumentaria e em pouco tempo a crise política se instalaria fortemente, deixando o presidente fragilizado e a esquerda dividida e acuada.
Para fazer mais do que fez nos seus dois primeiros mandatos, Lula precisa fazer um governo de ruptura total com o neoliberalismo, sem nenhuma daquelas concessões que foram tão criticadas pelo seu vice José Alencar. Se a centro-direita já considerava insuficientes aquelas concessões que Alencar condenava e se as concessões de Dilma a centro-direita também considerou insuficientes, é de prever-se a revolta da centro-direita quando Lula acabasse de vez com a mamata do rentismo. E no entanto Lula precisa acabar com a mamata do rentismo se quiser fazer mais do que fez nos seus dois primeiros mandatos.
Um governo assim é possível?
Mas será que um governo assim é possível? Será que é possível romper com o neoliberalismo sem sofrer um golpe de Estado? Acredito que é. Se a situação no mundo hoje é pior e a crise no Brasil é maior do que em 2002, por outro lado Lula também cresceu muito, tornou-se um gigante, uma liderança fortíssima, aqui e no exterior, enquanto a direita brasileira colhe uma enorme rejeição popular pelo fracasso da sua gestão neoliberal. Lula voltará à presidência em 2023 muito maior do que era quando chegou pela primeira vez, em 2003, maior até do que quando encerrou seu segundo mandato, com 87% de aprovação ao seu governo.
Porque depois de ser mais investigado do que qualquer outro cidadão brasileiro e depois de ter sido injustamente condenado nos tribunais e na opinião pública, Lula teve a sua inocência afinal reconhecida, ao mesmo tempo que era reconhecida a má fé dos seus julgadores, magistrados e jornalistas. Com isso a direita perdeu o único discurso que tinha para tentar abalar a sua credibilidade perante o povo, que era a acusa-lo de corrupção, e ele ganhou um raríssimo e por isso mesmo precioso atestado de idoneidade. Será muito difícil contê-lo depois de tudo que ele superou para chegar onde está e depois de tudo que o povo viu e viveu desde que ele iniciou o seu primeiro mandato. Por isso acredito que ele tem todas as condições para enterrar o neoliberalismo e avançar com um programa de esquerda mais radical do que o dos mandatos petistas anteriores.
Relação com a centro-direita
Mas para isso ele terá que manter uma completa independência em relação à centro-direita e fazer a disputa da opinião pública com ela desde a eleição, inclusive apontando a responsabilidade da centro-direita pela crise que o país atravessa. Porque a centro-direita é realmente a principal responsável pela tragédia brasileira. Não só pelo ataque que liderou contra a democracia, trazendo a extrema-direita a reboque, mas também pelo ataque à soberania nacional e aos direitos do povo, perpetrados com o apoio da extrema-direita.
É, portanto, mais do que previsível que a centro-direita venha a ser a principal força de oposição ao futuro governo Lula, como foi a principal força de oposição em todo o período que o PT esteve na presidência da república. A centro-direita, que tanto atentou contra a democracia e o estado de direito para impor o seu programa neoliberal, não vai aceitar pacificamente que Lula interrompa esse programa e reverta o que dele já foi feito. Ela vai atacar, assim que se reposicionar depois da derrota, e o fará com a violência de sempre.
A centro-direita já mostrou claramente que não tem Lula e o PT apenas como adversários, ela os tem, isto sim, como inimigos numa disputa de vida e de morte. Não se pode esquecer que a centro-direita fez de tudo para cassar o registro do PT e não se pode esquecer que a centro-direita fez de tudo para cassar os direitos políticos de Lula. A centro-direita mostrou com isso que não quer apenas derrotar, ela quer destruir o maior partido da esquerda e seu maior líder. E o passado da centro-direita indica que ela se aliará à extrema-direita e atentará contra o estado de direito e a democracia sempre que achar necessário para alcançar os seus fins, determinados pela ganância dos ricos. brasileiros e estadunidenses, que ela representa nas disputas políticas.
Por isso é uma temeridade Lula e o PT baixarem tanto a guarda e tratarem-na apenas como adversária numa disputa democrática pelo governo, admitindo até aliar-se com ela, na presunção equivocada de que ela tem mais respeito pela vontade do povo e pela Constituição do que a extrema-direita. Não tem, a história o mostra. Por isso é preciso precaver-se contra ela e combatê-la duramente desde já, não esperar que ela tome a iniciativa da ofensiva. Porque a centro-direita vai atacar o futuro governo Lula com aquela mesma ferocidade e persistência com que atacou todos os governos petistas, inclusive os dois mandatos do ex-presidente, agora candidato.
Aliança com o maior inimigo
O discurso de Lula tem sido fortemente antineoliberal e fortemente anti-imperialista. É, portanto, bastante apropriado, identifica bem as causas dos problemas mais graves que o país padece e aponta na direção certa para superá-los. Mostra, sobretudo, esse discurso, que Lula está consciente do enorme desafio que tem pela frente, mas também que ele está muito disposto a enfrentar esse desafio e fazer o que for preciso para vencê-lo.
Só que no debate público sobre quem deve ser o seu vice e sobre os partidos que devem compor a sua aliança eleitoral e de governo, tem prevalecido a ideia de que uma aliança com a centro-direita é necessária para garantir a governabilidade, admitindo inclusive que a vice-presidência seja dada a algum político ou partido desse campo. O problema é que a centro-direita foi a grande protagonista do golpe de 2016 e tem sido a grande impulsionadora e defensora do programa neoliberal e pró-imperialista que passou a ser implementado, primeiro por Temer e depois por Bolsonaro. Como se pode acreditar que logo essa golpista neoliberal possa dar segurança a Lula para ele desfazer o que ela própria fez? Isso é um contrassenso, não faz o menor sentido.
Uma aliança da esquerda com a direita só pode dar resultados que satisfaçam ao povo quando a ganância dos ricos permite. E isso é muitíssimo raro, só em conjunturas econômicas excepcionais acontece. Aconteceu entre 2003 e 2010 mas não há nenhum sinal de que possa voltar a acontecer no próximo período. Hoje, no Brasil e no mundo, a avidez dos ricos por dinheiro está em alta, a concentração de renda e riqueza segue de um lado uma escalada vertiginosa incessante, enquanto do outro lado bilhões de pessoas padecem na pobreza e miséria. A regra tem sido os ricos comandarem as instituições dos Estados capitalistas e estas governarem de acordo com os seus interesses, com total desprezo pela maioria da população dos seus países. E no Brasil os ricos são representados na política exatamente pela centro-direita.
Alckmin vice
Geraldo Alckmin surgiu recentemente no debate público como possível candidato a vice de Lula. Ele tem uma longa história política como defensor e executor de programas de governo neoliberais. Pergunto aos entusiastas dessa inusitada chapa: Geraldo Alckmin mudou? Geraldo Alckmin deixou de ser neoliberal, admitiu o fracasso desse modelo de gestão pública, do qual por tanto tempo foi adepto? Ele rompeu com o mercado financeiro, ao qual por tanto tempo serviu? Que eu saiba, não, por isso não acredito que Lula esteja levando a sério essa ideia. Dizem os defensores dessa aliança, que Alckmin contribuiria para uma vitória em primeiro turno atraindo votos do eleitorado dele. Mas será que Alckmin precisa mesmo ser vice para chamar os seus eleitores a votarem no Lula? Evidentemente que não, ele pode muito bem fazê-lo sem estar na chapa.
Agora, vamos refletir um pouco. O eleitorado de Alckmin é o eleitorado da centro-direita, que vota nele exatamente por acreditar nas ideias políticas e econômicas que ele historicamente defende e representa, que são as ideias neoliberais e o antipetismo. Que outra expectativa um eleitor de Alckmin poderia ter ao votar no Lula senão a de que Alckmin, na condição de vice, seria um sabotador do governo petista e um aliado da oposição neoliberal instalado em posição estratégica para, havendo oportunidade, capturar a presidência e implementar o seu próprio programa, como fez Temer com Dilma? E como é que um eleitor petista de Lula consegue ter expectativa diferente dessa quanto ao provável comportamento de Alckmin na vice-presidência de Lula? Não faço a menor ideia.
Alckmin sempre defendeu para a economia do país exatamente o que Bolsonaro tem implementado no seu governo. Por isso não acredito mesmo que Lula queira tê-lo como seu vice. A menos que o próprio Alckmin tenha lhe confidenciado que deixou de ser neoliberal e que pretende anunciar essa mudança durante a campanha. Aí, sim, a aliança deles poderia fazer algum sentido. Mas acho, em primeiro lugar, muito improvável uma conversão de Alckmin ao antineoliberalismo, não há nenhuma declaração dele que sugira a intenção de deixar de ser o que sempre foi, um fiel servidor dos ricos e um adepto fervoroso das ideias neoliberais. E em segundo lugar, lembrando que Alckmin apoiou o golpe de 2016 e a prisão de Lula, não acho que seja prudente confiar na palavra dele, o risco de traição seria enorme.
Alckmin mostrou nos momentos mais decisivos da história recente que não tem o menor compromisso com o povo e que não tem o menor apreço pela verdade, pela legalidade e pela justiça. O caráter dele não difere em nada do caráter de Dória. O atual governador de São Paulo só tornou-se seu desafeto porque o traiu na disputa interna pelo comando do PSDB. Aliás, Alckmin só saiu do PSDB porque Dória barrou a sua candidatura a governador, senão ele ainda estaria lá, fazendo o discurso de sempre. Mas tem gente na esquerda que resolveu apagar o passado de Alckmin e dele dizer maravilhas, numa inusitada campanha para vender a ideia de que ele é confiável e que não trairia Lula, se fosse seu vice.
Recentemente, 29 de dezembro, o deputado Marcelo Freixo foi entrevistado no canal da Revista Fórum e deu declarações pra lá de surpreendentes. Surpreendente é Freixo dizer, por exemplo, que Alckmin é “íntegro, correto e completamente diferente de Michel Temer“. Na vida real, Alckmin apoiou o golpe tanto quanto Temer. Não só isso, apoiou o programa neoliberal que Temer passou a implementar desde que tomou posse. Que integridade e correção são essas que Freixo enxerga, sabendo que Alckmin foi aliado de Temer numa empreitada verdadeiramente criminosa ,que tão elevado custo tem tido para o país, a democracia e os trabalhadores?
Reveladora é a declaração de Freixo, de que “em termos de estratégia, trazer a terceira via para dentro da primeira possibilita uma vitória mais consolidada, quem sabe no primeiro turno, o que seria ideal, na minha opinião”. Ok, mas e o dia seguinte ao da eleição? Qual seria o real compromisso de Alckmin com o programa antineoliberal e anti-imperialista de Lula? E como se pode ter tanta confiança em quem já atentou contra o estado de direito, ao apoiar o impeachment de Dilma e a condenação sem provas de Lula? Se o caráter golpista ali se revelou tão claramente, em que se baseia a crença de que ele seja um democrata e um legalista e de que não faria contra Lula o mesmo que Temer fez contra Dilma?
Não faz o menor sentido essa exaltação de inexistentes virtudes morais e democráticas. Ignorar a história da centro-direita brasileira e desse seu histórico representante, Geraldo Alckmin, é ignorar o altíssimo risco que uma aliança com eles pode representar para o futuro governo da esquerda. Não, Lula não vai cair nessa armadilha, nem ele, nem o PT.
Nada decidido. Primeiro o programa
Em 16 de dezembro de 2021, o Diretório Nacional do PT divulgou uma nota dizendo que "no processo de construção da candidatura Lula Presidente, o PT prosseguirá dialogando com as forças, movimentos e partidos políticos, em torno de um programa de reconstrução do país, centrado nos direitos do povo, da classe trabalhadora e da soberania nacional"; e que “a definição de alianças e composição da chapa presidencial serão decorrentes desse processo de interlocução com partidos, forças políticas e movimentos sociais, como é de nossa tradição democrática, não tendo nada definido neste momento".
As declarações da presidente do PT, Gleisy Hoffmann, e do próprio Lula vão nesse mesmo sentido e mostram que o partido e seu maior líder não vão ceder às pressões para inverterem a hierarquia dos elementos da sua tática eleitoral. Lula e o PT têm um programa de governo muito bem definido e condicionam a escolha do vice e as alianças com outros partidos ao acordo em torno de um programa comum semelhante a este que defendem, sem fazer concessões que o descaracterizem e enfraqueçam o seu caráter essencialmente antineoliberal e anti-imperialista.
Ou seja, o ex-presidente e seu partido querem primeiro definir um programa comum com os partidos para, aí sim, formalizarem uma aliança e só depois definirem o vice. Sabem que não há margem para rebaixar muito as metas do programa que defendem sem frustrar as expectativas que a sociedade já tem em relação ao futuro governo. E é exatamente por isso que Lula adia a confirmação da sua candidatura, porque ele quer primeiro a definição do programa com que terá que se comprometer. Ele não quer dar um salto no escuro, comprometer-se com algo que outros vão definir depois e que não sabe o que é.
Portanto, não vamos nos precipitar e tirar conclusões a partir de fatos que não existem, que apenas são cogitados, mas que podem perfeitamente ser evitados e serão evitados. Serão evitados pelo próprio Lula, que é uma pessoa inteligente e experiente, que ama o Brasil e o povo brasileiro, mas que também tem um enorme apreço e preocupação com sua própria biografia e não vai querer sujeitar-se a um arranjo político que teria tudo para terminar em fracasso.
Quando Lula anuncia que quer um Estado forte para ser indutor do desenvolvimento e garantir os direitos do povo; quando Lula anuncia que vai revogar o teto de gastos e a reforma trabalhista; e quando Lula anuncia que vai mudar a política de preços da Petrobras e reverter privatizações, ele já está definindo com qual programa pretende governar e que princípios e diretrizes desse programa são para ele inegociáveis. Com isso ele já dá a tônica do programa da coligação que se está montando e condiciona ao compromisso com estes pontos elencados tanto a escolha do vice quanto as alianças com os partidos.
Alckmin não será vice
Por tudo isso, insisto, não acredito que Lula aceite ter Alckmin como vice. Em primeiro lugar porque Alckmin é um importante quadro da centro-direita e a centro-direita defende a política econômica de Bolsonaro e quer que essa política econômica tenha continuidade. Portanto, a centro-direita é parte do problema que o governo de esquerda vai ter enfrentar e não parte da solução. E em segundo lugar não acredito que Lula aceite ter Alckmin como vice pelo risco enorme a que ele, evidentemente, estaria expondo o seu mandato de presidente. Alckmin vice transformaria a candidatura de Lula num cavalo de troia, um verdadeiro presente de grego para o povo brasileiro. E isso fatalmente levaria o seu governo a um fracasso descomunal.
Em 7 de janeiro, o ex-ministro das relações exteriores, Celso Amorim, disse ao Brasil247 que "o Lula passa a mensagem de pacificação nacional ao se inclinar por um vice como o Alckmin. É uma mensagem de tranquilidade, (...) ajuda a dissipar essa ideia de que o Lula é radical. (...) É a maneira de juntar os democratas, num momento em que o bolsonarismo é o nosso grande inimigo. Temos que consolidar a democracia. Isso não é um dado. É claro que é bom ganhar a eleição, mas não adianta ganhar a eleição e ter 20% a 25% dos deputados e ter que negociar no varejo. É muito melhor negociar programaticamente, com a visão geral, ainda que você tenha que fazer concessões”.
Celso Amorim é um homem inteligente e vivido, mas está completamente enganado. Como já dito neste texto, a situação da economia no Brasil e no mundo hoje é muito mais complicada do que em 2003, quando Lula assumiu pela primeira vez a presidência. O Lula hoje não tem margem nenhuma para negociar com o mercado financeiro, que Alckmin e a centro-direita representam, fazer-lhes concessões, sem aumentar ainda mais o sofrimento do povo. E não é por causa do Bolsorano ou da epidemia, é por causa do estrago que a Ponte Para o Futuro já fez. A situação do país já vinha muito mal no final do governo Temer, a centro-direita quer que o povo esqueça disso e muita gente realmente esquece.
Se não derrotar o mercado financeiro Lula não tem como corresponder às expectativas altíssimas que o povo já tem sobre o seu futuro mandato. Ele não tem saída, não pode fugir da briga, tem que encarar. E Lula já está encarando o mercado financeiro, o tiroteio, inclusive, já começou, de um lado Lula e Gleisy, presidente do PT, e de outro O Globo e Estadão, pelo PIG (Partido da Imprensa Golpista), da centro-direita.
O que Lula quer com Alckmin e o que Alckmin quer com Lula
Mas então por que Lula não rejeita logo o nome do Alckmin e encerra essa discussão bizarra? E Alckmin, por que não nega de uma vez. A atitude dos dois só alimenta as especulações sobre essa aliança inviável, pela absoluta incompatibilidade entre as ideias econômicas e políticas que eles historicamente defendem. Lula e Alckmin realmente parecem gostar de toda essa agitação que provocam, com a aproximação que encenam. E se gostam, é porque evidentemente consideram útil aos seus projetos políticos. Mas que utilidade será esta, que ganho é esse que estão tendo, que faz com que aparentem satisfação e façam declarações e gestos que mais provocam a imaginação fértil de uma sociedade machucada e triste, carente de boas notícias que lhe renovem as esperanças num melhor porvir?
Lula é franco favorito na eleição presidencial, liderando uma esquerda que se fortalece muito como alternativa de governo para o país, em face do fracasso do projeto neoliberal da direita. Alckmin é favorito na eleição para governador de São Paulo, representando uma centro-direita falida que, eleitoralmente derrotada no plano nacional, abraçou um projeto golpista e acabou perdendo o protagonismo que tinha, ao trazer a extrema-direita para o palco principal da política.
Alckmin é um dos poucos sobreviventes de uma geração de políticos de centro-direita que perdeu relevância depois dos desastres provocados no país por suas escolhas antidemocráticas, antinacionais e antipopulares. Como já dito, ele apoiou o golpe de 2016 que depôs Dilma e desde então vem apoiando a implementação do programa neoliberal chamado Ponte Para o Futuro, primeiro por Temer e agora por Bolsonaro. E como também já dito, Alckmin saiu do PSDB não por ter mudado de opinião sobre o neoliberalismo e sim porque sua candidatura a governador de São Paulo foi simplesmente barrada por Dória, senão ainda estaria naquele partido.
A jornalista Malu Gaspar, da Globo, disse que segundo pessoas próximas a Alckmin ele quer mesmo ser vice de Lula, por isso não nega os boatos. Ela diz que segundo essas fontes, embora as pesquisas indiquem o seu favoritismo na disputa pelo governo de São Paulo, ele teme sofrer uma nova derrota para Dória, que obviamente mobilizará a máquina do governo de estado para favorecer o seu candidato. A vitória como vice de Lula seria, a meu ver, para ele, uma volta por cima, depois dos reveses sofridos na disputa com Dória, e ao mesmo tempo lhe reabilitaria como liderança da centro-direita no plano nacional, recuperando a visibilidade, o prestígio e a influência que ele um dia já teve. Este ganho ele já está tendo, em boa medida, só com os boatos sobre a aliança com Lula.
Mas, e Lula, o que será que pretende, deixando a boataria correr solta na imprensa e nas redes sociais sobre essa inadequada aliança com o golpista neoliberal, Geraldo Alckmin? Para mim, Lula não quer ter Alckmin como vice. O que ele quer é estabelecer com Alckmin uma relação que permita o apoio dele e de uma parte da centro-direita à sua candidatura num eventual segundo turno contra Bolsonaro e uma relação que ao mesmo tempo sirva de padrão para a relação que ele quer ter com a oposição no seu próximo mandato.
Lula não quer, por não ser possível, que Alckmin deixe de ser centro-direita e vire esquerda, que deixe de ser neoliberal e torne-se desenvolvimentista, tampouco pretende rebaixar as metas do seu programa de governo para agradar à centro-direita e obter o seu apoio. O que Lula quer é fortalecer Alckmin para tê-lo como interlocutor na liderança da oposição de centro-direita ao seu futuro governo. É só por isso que ele o prestigia tanto e o eleva a uma posição de tamanha importância e dignidade no debate público, omitindo até nas referências que faz o papel nefasto que ele teve na história recente do país.
O sonho irrealizável de Lula
O sonho do Lula é governar com uma oposição de centro-direita que reassuma o compromisso com as regras e parâmetros da democracia burguesa, fazendo autocrítica do golpe de 2016, respeitando o estado de direito e renunciando ao golpismo, para isolar a extrema-direita e evitar novos golpes de Estado. Mas será isto possível? Acredito que não. Não acredito que seja realizável esse sonho de Lula porque a ganância dos ricos jamais vai permitir pacificamente que um governo de esquerda traga os milhões de brasileiros pobres para a mesa do seu banquete. Os ricos querem ser ainda mais ricos, eles nunca se contentam com o que têm. E para aumentarem suas fortunas, os ricos precisam impor aos pobres, através dos governos, cada vez mais sacrifícios. Por isso os ricos não suportam governos de esquerda e sempre tentam derrubá-los. Porque governos de esquerda não se prestam a fazer esse trabalho sujo.
O sonho de Lula não vai se realizar. A centro-direita será sim a principal força de oposição ao seu governo mas ela não vai se comportar como ele espera. A trégua da centro-direita, se houver, será apenas pelo tempo necessário para ela se reposicionar depois da derrota. Aí ela começará a ofensiva contra o governo de esquerda eleito. Lula não terá descanso e será alvo de ataques tão vis e covardes quanto aqueles que sofreu no passado. Esses ataques virão dos lugares de sempre, do parlamento, dos tribunais de justiça, das forças armadas e dos grandes meios de comunicação. Tentarão sabotar o seu governo, abalar a confiança e respeito que o povo lhe tem com reiteradas denúncias de corrupções inexistentes, e se tiverem oportunidade o tirarão da presidência, como tiraram Dilma.
Não serão tempos de paz, serão tempos de guerra, que Lula só poderá vencer se trouxer para os campos de batalha o povo trabalhador, como seu principal aliado nos combates. Lula e o PT precisam investir pesada e insistentemente na governabilidade com base na mobilização social. Senão o fizerem o governo da esquerda será sitiado, não suportará as pressões e poderá cair ou capitular, frustrando as expectativas do povo e mergulhando o país numa crise ainda mais profunda, sem perspectiva nenhuma de recuperação. Seria uma derrota histórica. Por isso a aliança e a unidade de ação entre a esquerda e o povo trabalhador são tão necessárias, são mais necessárias do que nunca. Porque só essa aliança e essa unidade de ação em combate é que podem realmente sustentar o governo Lula e ajudá-lo a libertar o país da tirania dos ricos. Lula, o PT, a esquerda e o povo. Esta é a única aliança realmente capaz de tornar o Brasil uma nação soberana, socialmente justa e democrática. Viva Lula e a unidade da Frente de Esquerda com o Povo!