"A agenda que o Temer está propondo e representa não passou pelo crivo das urnas. Ao contrário, agendas muito similares a esta tem passado pelo crivo das urnas e tem sido sistematicamente rejeitadas. Então eu fico muito preocupado quando nós, economistas, ou um grupo da elite política – sob investigação, diga-se de passagem – quer colocar para a população uma agenda econômica, de como deve ser o país, à revelia do que a população vem falando há algum tempo. Ela não quer isso."É exatamente isso que eu venho dizendo, que o projeto da direita não passa nas urnas. Por isso a direita precisa tanto do golpe. E por isso a melhor resposta ao golpe seria exatamente a antecipação da eleição presidencial. Uma eleição agora levaria a disputa política para o campo do debate programático, onde a esquerda leva, indiscutivelmente, vantagem sobre a direita, porque tem um programa que responde muito melhor aos anseios da classe trabalhadora.
http://g1.globo.com/globo-news/entre-aspas/videos/t/entre-aspas/v/entre-aspas-o-momento-economico-do-pais-e-o-impacto-de-um-possivel-novo-governo/5000146/
O projeto da direita, como bem frisou o economista da Unicamp, já foi quatro vezes seguidas derrotado nas urnas e tem sido claramente reprovado pela maioria dos trabalhadores no atual governo, que resolveu adota-lo, mesmo em versão atenuada. A conclusão é simples e cristalina. Os trabalhadores não querem o programa econômico da direita. Numa eleição, portanto, qualquer programa semelhante ao defendido hoje por Michel Temer seria a “ponte para a derrota” de qualquer candidato que a direita lançasse.
O debate programático constitui, portanto, o meio mais eficaz para se deter a ofensiva conservadora. Não é atoa que a direita se empenha tanto em sobrepor a ele a pauta do combate à corrupção. A direita não quer debater programa porque sabe que perde apoio na opinião pública, perdendo, por conseguinte, votos e eleições.
A esquerda parece que ainda não se deu conta de que está hoje completamente encurralada pela pauta do combate à corrupção, imposta e instrumentalizada pela direita, através da mídia, do Judiciário, do Legislativo, do Ministério Público e de setores da Polícia Federal. Não tem havido espaço nenhum para o debate programático que poderia dar aos trabalhadores uma visão mais clara sobre o que está realmente em jogo na presente disputa política. Só uma eleição permitiria que a esquerda introduzisse no debate público da sociedade a pauta da política econômica e suas repercussões na vida dos trabalhadores, confrontando o seu próprio programa de governo com o programa da direita, como fez de forma bem sucedida em 2002, 2006, 2010 e 2014.
Os que se opõem à antecipação da eleição presidencial, insistem no discurso da “resistência até o final”. Mas a medida real da resistência corresponde à força que se tem para resistir e é evidente que a esquerda não tem tido força suficiente para resistir ao avanço do golpe. A força que está faltando é da classe trabalhadora, que não tem se sensibilizado pelo discurso democrático da pequena burguesia. “Democracia, prá que”, deve pensar o trabalhador. Emprego, salário, saúde, educação, segurança, mobilidade urbana e outros direitos, é disso que ele quer saber e é só isso que pode empolgá-lo a ir prá rua defender a democracia.
O discurso democrático tem que responder às demandas reais, concretas, do povo, ou não será pelo povo compreendido e aceito como válido. A democracia, para ser valorizada, precisa de um conteúdo, que são os direitos que ela garante, não pode ser apenas um conjunto de princípios e regras que sejam fins em si mesmos ou que sejam destinados a alcançar objetivos abstratos. A democracia serve para criar e garantir direitos individuais e coletivos. Ocorre que, na presente luta contra o golpe, a esquerda tem falado de respeito ao voto popular e ao mandato legitimamente conquistado pela presidenta, e da ausência das condições constitucionais para a aprovação do impeachment. E estes são aspectos formais da democracia, não o conteúdo que a justifica e que interessa aos trabalhadores.
Sem mídia própria para dialogar com as massas, a esquerda está e continuará encurralada pela pauta do combate à corrupção. Na luta contra o golpe, a esquerda não tem conseguido fazer mais do que acusar a ilegitimidade do processo contra Dilma que, não obstante, avança, dia a dia, com impressionante facilidade. Enquanto isso, o cerco a Lula vai se fechando, sendo já razoável prever que ele seja em breve preso. E mesmo assim, Lula, Dilma, PT e a Frente Brasil Popular, parecem crer que ainda seja possível derrotar o golpe sem mudar a estratégia até agora adotada, que só tem conseguido mobilizar a pequena burguesia, deixando à margem da luta a maior parte da classe trabalhadora, as chamadas classes C, D e E.
Suponho que apostem na experiência que as massas vão fazer com o governo Temer, nos seis meses que Dilma estiver afastada. A experiência das massas será padecer os efeitos da aplicação do programa da direita, que terá a seu favor uma burguesia unida e o controle absoluto do Estado e da mídia. A classe trabalhadora, por sua vez, será pega quase que inteiramente desprevenida, desorganizada e desmobilizada, impossibilitada, inclusive, de lançar mão da greve, que é a sua maior arma, em razão do desemprego provocado pela recessão econômica, cujo aprofundamento é previsível, como decorrência da política implementada pelo governo.
Serão condições bem mais desfavoráveis do que as atuais para a esquerda reagir. Penso que vamos ter no país o advento de um regime autoritário, porque só um regime autoritário seria capaz de impor ao povo os sacrifícios previstos no programa de austeridade que tem sido anunciado. E a direita já mostrou que está disposta a tudo. Com os instrumentos que já tem - mídia, Judiciário, Legislativo e polícias dos estados -, acrescidos pelas Forças Armadas, pela Força Nacional de Segurança e pela Polícia Federal, a partir da conquista da presidência da república, o poder de repressão da direita para enfrentar a resistência dos movimentos sociais será descomunal e, portanto, muito difícil de ser vencido.
Discordo, por isso, da opção feita por Dilma e pela Frente Brasil Popular de recusar a proposta de antecipação da eleição presidencial. A insistência na luta pela preservação de um mandato que já está perdido será, na prática, um consentimento para que Michel Temer assuma a presidência da república, atingindo o objetivo da direita de tomar o poder, instaurar uma ditadura e botar em execução o seu programa, sem precisar passar pelo processo eleitoral, no qual este programa poderia ser julgado e, certamente, rejeitado pelos trabalhadores, como foi nas quatro eleições anteriores. Porque, como já foi dito, o povo brasileiro não quer o projeto da direita. A direita sabe disso, por isso apela para o golpe e a ditadura. Mas, e a esquerda? O que ganha evitando a eleição antecipada, desejada por 62% dos brasileiros? A meu ver, não ganha nada. Prepara apenas o caminho para a consumação de uma derrota histórica, da qual dificilmente poderá ser refazer.
Silvio Melgarejo
07/05/2016
https://www.facebook.com/notes/silvio-melgarejo/os-trabalhadores-n%C3%A3o-querem-o-programa-econ%C3%B4mico-da-direita-s%C3%B3-uma-elei%C3%A7%C3%A3o-pode-/1275106232502773
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