segunda-feira, 16 de novembro de 2020

Liberdade religiosa não pode ser licença para explorar e oprimir

Texto publicado em alguma comunidade do Orkut em 18 de junho de 2011

As religiões devem ser respeitadas? É o que perguntam no post de abertura deste tópico. Se entendermos por respeito às religiões a concessão pela sociedade de uma liberdade irrestrita para a difusão das suas doutrinas e práticas rituais, eu acredito que não, que as religiões não devem ser, nesse sentido, respeitadas. Penso que o que temos que nos perguntar não é se as religiões devem ser respeitadas e sim se convém ou não aos indivíduos e às sociedades que as religiões sejam respeitas incondicionalmente. Porque não há atividade humana que possa ser exercida fora dos limites impostos pela civilização sem que haja prejuízo para os indivíduos e para as sociedades. Por isso para mim as religiões devem ser respeitadas apenas enquanto respeitarem esses limites, para além dos quais elas estarão ferindo direitos que não é justo admitir que sejam ignorados. A liberdade das religiões tem que ser restrita e condicionada, tal como deve ser a liberdade de todos os indivíduos e organizações em qualquer sociedade que reconheça a igualdade de direitos fundamentais entre os seus cidadãos. O direito de uns não pode afrontar o direito dos outros. Quando isso acontece configuram-se as injustiças.

As religiões são, via de regra, tradições milenares que trazem em seu bojo a prescrição de normas, costumes e rituais, não raro, incompatíveis com os avanços conquistados pelas sociedades contemporâneas no campo dos direitos e garantias individuais. Nem tudo o que as religiões pregam está de acordo com estes direitos e garantias. E muito frequentemente o que se vê nos templos é a difusão de preceitos que são mal disfarçadas apologias de crimes. Por outro lado, também não é nada raro que líderes religiosos dediquem-se a insuflar seus seguidores para verdadeiras guerras santas contra quem discorde do que eles pregam e a convencer-lhes a doar para as suas igrejas o que eles têm e o que eles não têm, com a promessa de recompensas ou com a ameaça de punições da providência ou justiça divinas.

Fundamentalismo religioso nada mais é do que a adesão apaixonada a uma tradição religiosa, com abstinência de qualquer juízo crítico e divorciada de qualquer parâmetro ético sintonizado com os valores de uma sociedade civilizada. A religião, no estado democrático de direito, não pode colocar-se acima da lei. E os seus preceitos, normas e rituais que estiverem em desacordo com qualquer um dos direitos humanos já reconhecidos pela sociedade devem sofrer severa censura e intransigente proibição, para desencorajar a sua difusão e a sua prática. 

A liberdade religiosa, como qualquer liberdade, não pode ser incondicionada e irrestrita porque fatalmente acaba atentando contra outras liberdades. Ela deve respeitar limites e ter, necessariamente, como parâmetros a lei e os valores civilizatórios vigentes em cada sociedade. Se as leis garantem direitos, as religiões não podem ignorá-los e atuar como se leis não houvesse. Conceder às religiões liberdade ilimitada é abrir caminho para o cometimento de abusos, que à luz das leis vigentes nas sociedades que reconhecem os direitos humanos constituem crimes, como tantas vezes se viu ao longo da história e até hoje por vezes se vê. A liberdade religiosa não pode ser licença para explorar e oprimir gente indefesa. Portanto, não pode ser absoluta, deve ter limites.

Silvio Melgarejo

18/06/2011
Revisado em 16/11/2020

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