sexta-feira, 17 de abril de 2015

Decisão histórica: O PT não aceita mais doação de empresas.

O Diretório Nacional do PT tomou hoje uma das mais importantes decisões da história deste partido. A partir de agora, o PT não aceitará mais doações financeiras de empresas para suas campanhas eleitorais. A resolução diz o seguinte:
"Ao mesmo tempo que lutamos pelo fim do financiamento empresarial decidimos que os Diretórios Nacional, estaduais e municipais não mais receberão doações de empresas privadas, devendo essa decisão ser detalhada, regulamentada e referendada pelos delegados(as) ao 5º. Congresso Nacional do PT.

O Partido revitalizará a contribuição voluntária, individual dos filiados, filiadas, simpatizantes e amigos. Tais definições são coerentes com nosso Estatuto, segundo o qual “arrecadação básica e permanente do Partido é oriunda de seus próprios filiados”. Ao mesmo tempo, condizem também coerentemente com a nossa defesa de uma reforma política democrática que ponha fim à interferência do poder econômico nas decisões políticas."
Esta resolução é importante por duas razões.

Em primeiro lugar, porque não existe independência política onde há dependência financeira e o PT, realmente, se tornou completamente dependente do dinheiro dos empresários para financiar suas campanhas.

E ao se tornar dependente financeiramente dos empresários, o partido fatalmente perdeu também a independência política, o que explica muitas de suas omissões, hesitações e decisões equivocadas. ´

Em segundo lugar, esta decisão é importante porque o dinheiro fácil das empresas acabou colaborando para o abandono completo de qualquer preocupação dos dirigentes e  parlamentares do partido com o trabalho político e organizativo junto aos filiados de suas bases.

Agora acabou a mamata dos dirigentes fantasmas e dos candidatos sumidos. Quem quiser ter dinheiro para campanha, vai ter que construir e manter uma boa e saudável relação política com os filiados de sua base.

Hoje os diretórios não funcionam ou funcionam muito precariamente porque os dirigentes e candidatos não precisam das contribuições financeiras dos filiados, já que contam com as generosas "doações" de empresários muito "solidários" e "desinteressados".

Com a decisão tomada, os dirigentes e parlamentares vão ter que procurar os filiados de base, ou vão ficar sem dinheiro para as campanhas.

O PT deu hoje, portanto, um importante passo na direção do resgate de sua independência de classe. Não seria mesmo possível recuperar a independência política do partido como organização dos trabalhadores, enquanto da burguesia o partido continuasse dependente para o financiamento de suas campanhas eleitorais.

A partir de hoje, quem tem que bancar as campanhas eleitorais do PT, com dinheiro, sangue e suor, são os seus mais de 1,5 milhão de filiados e os milhões de eleitores do partido espalhados por todo o país.

A decisão histórica do PT de abolir a arrecadação financeira para campanhas eleitorais junto a empresas, acaba ademais com a contradição que havia entre a prática do partido e a proposta que ele defende de uma reforma política que estabeleça a proibição das doações empresariais.

Ao tomar a iniciativa de auto-impor-se esta regra, o PT enche-se de autoridade moral e política para discutir esta proposta com os trabalhadores, para cobrar dos demais partidos que transformem esta regra em lei e para cobrar de Gilmar Mendes que libere o processo que dela trata, sobre o qual há um ano ele está sentado.

Trata-se, portanto, de uma decisão que tem um grande significado político, capaz, inclusive, de resgatar a autoestima um tanto combalida da militância petista e alimentar sua esperança hoje minguada de uma efetiva renovação do PT, depois de tantos acidentes.

A militância agora vai poder, enfim, erguer a cabeça, bater no peito e encher a boca para dizer que o PT não quer e não depende do dinheiro da burguesia prá fazer campanha, porque o PT é o partido socialista dos trabalhadores e não tem rabo preso com patrão nenhum.

Mas se a renúncia das doações empresariais fortalece, de fato, o PT na luta pela reforma política, ela não garante que a proibição para todos os partidos aconteça até a eleição do ano que vem, seja pela aprovação no Congresso, seja por decisão do STF.

Isto significa que o PT vai ter que construir rapidamente a sua autonomia financeira para enfrentar as dificílimas eleições municipais de 2016.

Trata-se não só de um desafio político, mas de um desafio que é, sobretudo, administrativo.

O Estatuto do PT já define claramente qual deve ser a fonte de financiamento para todas as suas atividades, inclusive as eleitorais: os filiados do partido.

Diz o Estatuto do PT, em seu capítulo sobre os direitos e deveres dos filiados:
"Art. 14. São deveres do filiado ou da filiada:
(...)
V – contribuir financeiramente nos termos deste Estatuto e participar das campanhas de arrecadação de fundos do Partido;"
E, mais adiante, em seu capítulo sobre Finanças e Contabilidade:
"Art. 176. Os recursos financeiros do Partido dos Trabalhadores serão originários de:
I – contribuições obrigatórias de seus filiados e filiadas na forma deste Estatuto;
II – contribuições obrigatórias dos filiados e filiadas ocupantes de cargos eletivos, de confiança e dirigentes na forma deste Estatuto;
III – contribuições espontâneas de filiados ou filiadas e simpatizantes."
O cumprimento dessas disposições estatutárias exige que o partido tenha uma adequada política administrativa para os seus diretórios, principalmente para aqueles que constituem o último elo da cadeia de comando do partido em cada região, que são os diretórios zonais das capitais com mais de 500 mil habitantes e dos municípios com mais de 1 milhão, e os diretórios municipais das cidades menores. Estes diretórios são os que estão em contato mais direto com a base do partido.

Mas, como o PT nunca definiu política administrativa nenhuma, a arrecadação financeira também nunca foi feita da forma determinada pelo Estatuto. Agora vai ter que ser.

O PT, depois da acertada decisão que hoje tomou, fica, portanto, obrigado a encarar e dar solução para o seu histórico déficit administrativo, resultante de uma concepção equivocada de construção partidária, segundo a qual a política se realiza espontaneamente, dispensando a administração partidária.

O PT vai ter que, finalmente, admitir o fato de que sem administração, nenhuma política se realiza, ou não vai conseguir conquistar a sua autonomia financeira.

E, sem autonomia financeira, a independência financeira em relação à burguesia, agora decidida, vai tornar, fatalmente, o partido eleitoralmente menos competitivo e, portanto, mais sujeito a derrotas.

A resolução de hoje é, realmente, uma das mais importantes decisões que o PT tomou em pelo menos uma década, e os petistas têm motivos de sobra para se encherem de orgulho e esperança, motivos de sobra para festejar.

Mas esta decisão tão acertada coloca, ao mesmo tempo, o PT diante do maior desafio de toda a sua história, que é o de revolucionar-se administrativamente para ser capaz de realizar uma política revolucionária.

Vencer este desafio, cujo enfrentamento adiamos por 35 anos, desde a fundação do partido, exigirá de todos os membros do PT que superem preconceitos e renovem concepções.

Há, de fato, uma dura luta a ser travada dentro do PT para dotá-lo da organização, do comando e da disciplina, que são indispensáveis para o êxito de qualquer organização combatente, seja de natureza militar, seja de natureza política.

Não é uma luta entre tendências, é uma luta pela superação de uma cultura política e pela assimilação de outra.

Uma luta pela superação da cultura política sem sentido prático, que despreza a administração partidária, e pela assimilação de uma cultura política focada na ação, que tenha a administração partidária como elemento essencial, capaz de transformar ideias em atos e projetos em realizações.

"Sem administração, não se realiza a política" é a frase que melhor resume as necessidades do PT nesta sua nova fase.

Comando, organização e disciplina não são, em verdade, elementos da politica, são elementos da administração, dos quais o PT precisa para realizar a sua política e se tornar autossustentável financeiramente, mais democrático internamente e mais efetivo em suas ações nas ruas..

Na verdade, pensando bem, o que tenho chamado de cultura política é a cultura partidária, composta pela cultura política e pela cultura administrativa do partido.

O PT tem cultura política, mas não tem uma cultura administrativa que dê consequência a ela, ou seja, que dê sentido prático às decisões políticas sobre estratégias e táticas.

Sabemos agora, por exemplo, que precisamos de recursos financeiros para as campanhas eleitorais.

E tomamos a decisão política de que só vamos recorrer a uma única fonte para a obtenção destes recursos, que é a nossa base de filiados.

Trata-se, agora, de pensar, debater e decidir como vamos garantir, na prática, que todos os filiados paguem regularmente as suas contribuições financeiras.

É aí que entra a administração.

Saudações petistas,

Silvio Melgarejo

17/04/2015

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.