sábado, 3 de janeiro de 2015

Contra os Diretórios Fantasmas, um Pacto Pela Construção Partidária.

Diretório é uma unidade partidária dirigente, responsável pela representação oficial e pelo funcionamento do partido em determinado território. Os diretórios do PT são compostos por filiados eleitos em processos eleitorais internos chamados PEDs. PED é a sigla formada pelas iniciais de "Processo de Eleição Direta".

Chamo de "diretório fantasma" aquele cujos membros se elegem, são empossados, mas não aparecem para trabalhar.

Todo diretório tem atribuições claramente previstas no estatuto do PT e seus membros, individualmente, são dirigentes do partido, responsáveis pelo cumprimento destas atribuições. Os membros de diretórios fantasmas não cumprem atribuição nenhuma.

Diretório fantasma é aquele que se reúne apenas muito excepcionalmente e que, por isso mesmo, não discute, não delibera, não executa e não produz nada. É aquele diretório cujas secretarias de Organização, Comunicação, Finanças, Formação Política e Mobilização não cumprem suas funções, porque não têm projeto, nem disciplina, nem rotinas de trabalho.

Diretório fantasma é aquele cujos membros os filiados de base não sabem quem são, nem onde encontrar. É um diretório que o filiado nunca acha, nunca ouve e nunca vê, porque não existe de verdade, na prática, só existe formalmente, no papel.

Diretório fantasma é aquele que nunca procura os filiados da sua base, que não os visita, não manda carta ou e-mail, que não dá um telefonema sequer para saber se o filiado está vivo. É um diretório que não se comunica porque, de fato, não existe.

O PT está cheio de diretórios fantasmas. Por isso a democracia interna do partido não funciona e por isso o partido é incapaz de se renovar, de corrigir rumos e de promover ações coletivas envolvendo o conjunto dos seus filiados.

Entra PED e sai PED e a praga dos dirigentes fantasmas, que se elegem e somem, continua devastando o PT. Estes dirigentes, por falta de compromisso ou preparo, deixam de cumprir obrigações organizativas básicas que lhes são atribuídas pelo estatuto do partido e com isso inviabilizam inteiramente o funcionamento das suas instâncias.

Se houvesse tanto apetite para criticar e fazer cobranças ao governo do partido, quanto há para criticar e fazer cobranças ao governo do país, seria possível fazer do PT um partido capaz de exercer uma influência positiva bem maior do que tem tido sobre o governo do país, que tantas críticas recebe de todos os lados.

Mas ninguém critica, nem cobra nada das direções partidárias. As tendências do PT, que sobre o governo do país tanto divergem, convergem numa mesma postura omissa e conservadora em relação ao governo do partido. E, no entanto, este é o único acordo que não deveria haver entre elas.

O único acordo que deveria haver e não há entre as tendências petistas é quanto à prioridade do objetivo de fazer funcionar a democracia interna do PT, que depende do funcionamento dos seus diretórios. Aos que desejam uma renovação da estratégia, das direções, dos valores e das práticas petistas, muito mais do que aos conservadores, deveria interessar o funcionamento pleno e regular dos diretórios. Porque só o funcionamento dos diretórios pode conduzir à realização dos seus anseios.

Para mudar o PT, é preciso mudar a correlação de forças dentro do partido. Para mudar a correlação de forças dentro do partido é preciso que a democracia interna do partido esteja funcionando regular e plenamente, permitindo que o debate político envolva o conjunto dos filiados. Para que a democracia partidária funcione é necessário que os diretórios funcionem. E o funcionamento dos diretórios depende da forma como eles são administrados.

Se os diretórios não funcionam, não funciona a democracia partidária e se não funciona a democracia partidária a massa de filiados acaba sendo excluída do debate e das decisões internas do partido, o que impossibilita que haja mudança na correlação de forças entre as diferentes posições políticas, favorecendo à manutenção da posição hegemônica.

A imensa maioria dos petistas insatisfeitos com os rumos do partido parece ainda não ter se dado conta disso e é difícil acreditar que as tendências minoritárias não tenham esta consciência. E se sabem e ainda assim mantém atitude igual à da maioria conservadora, é porque certamente deve haver para elas alguma vantagem na inatividade dos diretórios, na exclusão da maioria dos filiados dos debates e decisões internos do PT, na limitação extrema, enfim, da democracia partidária a estreitos círculos de filiados. Que vantagem seria esta, me escapa ao entendimento.

De modo que o que mais se vê no PT hoje é petista evocando mudanças no partido enquanto contribui com sua atitude para a manutenção de tudo que condena.

Tenho ouvido muito que ou o PT muda ou acaba e tendo a concordar com isto. Mas acredito que a saída para a crise vivida hoje pelo partido não será pela esquerda, nem pela direita, pelo centro, nem pelo alto. A saída dessa crise só poderá vir dos de baixo, de um movimento da base do PT que imponha um novo padrão de atuação à cúpula dirigente do partido.

E para promover um movimento assim é que eu proponho um pacto entre as tendências petistas pela construção partidária, entendida como o ato de filiar simpatizantes do PT e criar e manter estruturas - os diretórios - e mecanismos -  regras de funcionamento - que permitam a participação de todos os filiados nos debates e decisões do partido, bem como o uso racional das suas contribuições financeiras, conhecimentos e habilidades na realização das ações políticas coletivas necessárias para a conquista de objetivos democraticamente estabelecidos.

A auto-denominada esquerda do PT acredita que a prioridade do partido deve ser mudar sua estratégia política, porque acha que é da estratégia errada que decorrem todos os problemas do PT, inclusive os organizativos.

Os que defendem esta tese insistem na sustentação de que o colapso da estrutura partidária de diretórios e núcleos de base teria se dado a partir de uma mudança de estratégia política do partido, ocorrida em 1995.

Desprezam solenemente o fato de que uma resolução política do 5º Encontro Nacional, de 1987, já apresentava o diagnóstico de uma crise organizativa crônica que se iniciara em 1982, treze anos antes do marco inicial apontado por eles. O PT tinha, então, apenas três anos de idade.

Esta crise organizativa, que se abateu sobre o partido, assim, tão precocemente, nunca foi superada e se estende até hoje, porque o diagnóstico do 5º Encontro sempre foi desprezado. E este diagnóstico dizia que a crise decorria da falta de quadros organizadores, capazes de conceber e executar uma correta política de construção partidária.

Abaixo, dois trechos da resolução do 5º Encontro:
"Outra ideia profundamente equivocada que costuma aparecer em nossos debates é a que opõe partido de quadros a partido de massas.

Para essa confusão contribui, também, a cultura tradicional da esquerda, que em geral teve uma visão estreita da ideia leninista de partido de vanguarda.

Se exagerarmos a dicotomia, temos de um lado um partido de quadros pequeno, estreito, sectário, formado de militantes, baluartes que tudo decidem e dirigem, e de outro um partido de massas frouxo, inorgânico, sem cotizações regulares, cada um fazendo o que bem entende e chamando filiados para fazer número em convenções, como qualquer partido burguês.

Se queremos um partido capaz de dirigir a luta pelo socialismo, não precisamos nem de uma coisa, nem de outra.

Precisamos de um partido organizado e militante, o que implica a necessidade de quadros organizadores.

Um partido que seja de massas porque organizará milhares, centenas de milhares ou até milhões de trabalhadores ativos nos movimentos sociais, e porque será uma referência para os trabalhadores e a maioria do povo.

(...)

A fragilidade das estruturas orgânicas do PT teve início na campanha eleitoral de 1982, quando diluímos nossos núcleos e Diretórios em comitês eleitorais de candidatos que, em sua maioria, terminaram em 15 de novembro daquele ano, com o fim da campanha.

De lá para cá, o PT encaminhou com relativo êxito algumas campanhas gerais, porém, até hoje, não conseguiu formular nem implementar uma política de organização que estimulasse o crescimento do Partido do ponto de vista orgânico (nucleação, formação política, finanças etc.).

Essa fragmentação tem muito a ver com a postura que se tomou em relação à construção partidária.

Mais que isto, tem a ver com a visão do papel do Partido que estamos construindo.

As campanhas gerais de intervenção na conjuntura, se por um lado aumenta as simpatias pelo PT, por outro lado, dissociadas de uma correta política de construção partidária, não conseguiram traduzir-se em aumento do nível de organização e enraizamento do PT na realidade social.

Ocorre, por vezes, o inverso, ou seja, o Partido geralmente sai das campanhas mais disperso e desorganizado, portanto, mais fraco para resistir a novos avanços da burguesia.

O esforço de intervenção na conjuntura, por meio de campanhas gerais, não foi acompanhado por uma política clara de reforço, politização e expansão da nucleação.

O resultado foi a drenagem de forças e elementos para ações gerais e conjunturais, levando a um colapso a estrutura dos núcleos e Diretórios."
Portanto, não foi a mudança de estratégia do PT em 1995 o que causou a crise organizativa que o partido vive até hoje, porque a crise já existia desde 1982. Desde aquela época o PT já tinha uma porção de diretórios e núcleos fantasmas que, quando muito, faziam as vezes de comitês eleitorais, como até hoje fazem, voltando à mais completa inatividade e inutilidade ao final de cada campanha.

Nenhuma das tendências petistas expressa qualquer preocupação com isso. Parecem todas muito satisfeitas com a democracia de poucos, de raríssimos, que temos hoje no PT. As que se apresentam como esquerda do partido, mantém um acordo tácito com as que classificam como direita para manter marginalizada a massa de mais de 1,5 milhão de filiados. Dizem que o maior problema do PT é a estratégia do partido e não a falta de democracia interna, e parecem acreditar que sem democracia se pode mudar a estratégia do partido.

O único acordo que deveria haver entre as diversas tendências do PT é quanto ao objetivo de fazer funcionar a democracia interna do partido. E a democracia interna do partido depende do funcionamento dos seus diretórios. O resto, sim, é que deve ser disputado. Porque o dia que todas as tendências estiverem de acordo sobre a política, não vai ser mais necessário haver tendências, já que teremos no partido uma só proposta e uma só corrente de opinião. As tendências expressam o dissenso e não o consenso dentro do partido. Mas um único consenso é fundamental que haja num partido que se define como democrático, que é quanto ao objetivo de realizar a democracia partidária, afim de que, dentro deste regime, as diferenças políticas se expressem e disputem a preferência da base de filiados.

Para mudar a estratégia política, como quer a auto-proclamada esquerda do PT, é preciso mudar a correlação de forças dentro do partido, já que a esquerda é minoritária no universo minoritário que participa dos debates e decisões nos diretórios. Para mudar a correlação de forças dentro do partido é preciso que a democracia interna esteja funcionando regular e plenamente, permitindo que o debate político envolva o conjunto dos filiados. Para que a democracia partidária funcione é necessário que os diretórios funcionem. E o funcionamento dos diretórios depende da forma como eles são administrados.

Se os diretórios não funcionam, não funciona a democracia partidária e se não funciona a democracia partidária a massa de filiados acaba sendo excluída do debate e das decisões internas do partido, o que impossibilita que haja mudança na correlação de forças entre as diferentes posições políticas, favorecendo à manutenção da posição hegemônica.

Este ano teremos o Processo Extraordinário de Eleições Diretas em nível municipal (PEDEX), que será realizado no dia 25/10/2015. E, como nunca ninguém quis tratar do tema da administração dos diretórios, serão eleitas novas direções fantasmas, que atuarão quando muito, apenas durante as eleições de 2016 e 2018, como um contingente enorme de meros cabos eleitorais, sem compromisso nenhum com a construção partidária. E tudo continuará como está.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.