Só com muita boa-vontade pode-se enxergar alguma relação do primeiro e dos dois últimos parágrafos com o resto do texto de Caetano, em que ele trata da eleição de Marcos Feliciano para a presidência da Comissão de Direitos Humanos e Cidadania, da Câmara Federal.
Quanto a este tema, ele está correto, não há o que reparar.
O problema está nos tais três parágrafos, enxertados, a meu ver, à força, pela ânsia de sempre dizer algo contra o governo liderado pelo Partido dos Trabalhadores.
Tanto tratam Caetano como “iluminado”, que ele acaba acreditando sê-lo, em tudo.
Reconheço e aplaudo sua genialidade como artista popular.
Já como intelectual, analista social e político, acho-o uma desgraça, um Magnoli piorado.
Como cidadão, ele tem o direito de dizer todas a bobagens que queira, como a frase do penúltimo parágrafo de seu texto, em que sugere que o Brasil, ao contrário do continente africano – que “está se erguendo” –, seria uma país “entalado”, de eternas promessas que nunca se cumprem.
É realmente extraordinário, que Caetano veja tão bem o progresso da África e não enxergue os avanços sociais evidentes alcançados no país em que vive.
Só um antipetismo patológico e exacerbado pode explicar essa hipermetropia em tão alto grau.
O Brasil é, hoje, um país que vive o melhor momento de toda a sua história, que se vê e é visto pelo mundo como uma nação democrática e soberana, capaz de enfrentar suas seculares mazelas com maturidade suficiente para causar inveja aos cidadãos do velho mundo.
Somos um país que, graças às acertadas medidas adotadas por seu governo, atravessa a crise mundial sem que o povo sofra os seus efeitos mais perversos, ao contrário do que acontece na maior parte do planeta.
Continuamos, mesmo com a crise, a reduzir impostos, a derrubar os juros, a gerar emprego, a aumentar salários, a reduzir a desigualdade social e a transferir renda diretamente para quem tem pouca ou nenhuma renda.
Tiramos, em uma década, 50 milhões de brasileiros da miséria.
Caetano não vê nada disso.
Vive no Brasil, fisicamente, mas tem a mente enjaulada em algum lugar escuro e distante da realidade dos fatos objetivos, vividos e reconhecidos pelo povo brasileiro e descritos e explicados pelos especialistas.
O artista iluminado, Caetano, é um analista social e político medíocre, com a visão inteiramente comprometida por preconceitos e interesses de classe, que gritam em cada linha dos seus discursos.
Ele brilha, como militante, apenas para os entusiastas das causas antipopulares, ao encarnar estas causas e prestigiá-las com seu apoio.
A luz da razão e do bom senso de justiça guia Caetano quando ele trata da luta contra as injustas desigualdades entre raças, gêneros e orientações sexuais.
Mas lhe falta, quando trata da desigualdade entre as classes sociais e do combate que se tem dado a ela, no Brasil, durante a última década.
Diante desse tema, Caetano é ou finge ser cego.
E o pior é que, a despeito disso, ainda há quem o aplauda e tome por guia.
***
O artigo de Caetano:
Um pouco de sensatez
Felizmente a ministra Marta Suplicy recuou da decisão de incluir as TVs a cabo no rol dos produtores de cultura beneficiados por mecanismos do ministério. O artigo de Cacá Diegues na semana passada deixava claro o absurdo que seria a aplicação da nova norma. TVs a cabo fazem dinheiro grande, são dinheiro grande, e nem traduzem os títulos ingleses das séries, quase todas americanas, que apresentam. Um ministério que deseje incentivar a criação cultural no Brasil não tem por que incluí-las em seus programas de incentivo.
Será crível que Marco Feliciano tenha sido escolhido presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias? Na explicação que ele ofereceu aos fiéis da sua igreja, a África é citada várias vezes como “esse país”, o que mostra ignorância a respeito do assunto que tratou com tanta veemência. Nitidamente ele vê a África como um todo unitário. Bem, a maldição dos que, miticamente, foram popular a África já foi usada antes pelos racistas de vários lugares para justificar a escravidão. Feliciano a usa, sem cuidado, para explicar Idi Amin, a Aids, as faminas etc. Uma autoridade responsável por uma comissão de direitos humanos não pode basear suas falas e atitudes em dogmas religiosos. Menos ainda se ele demonstra simplismo grosseiro na interpretação destes.
É difícil admitir que presida uma comissão que supostamente protege as minorias um homem que grita, irado, que se os homossexuais querem fazer “suas porcarias”, que as façam escondidos dentro de seus quartos, em suas casas, nunca se beijando em locais onde suas filhas possam ver “dois homens barbados, de pernas raspadas, aos beijos”. O pleito de casamento gay é um pleito de minoria representada que deve ser estudado por comissões parlamentares que tratem do assunto com calma, lucidez e isenção. Você pode seguir uma fé que determina que os atos homoafetivos são pecado (na verdade, são O PECADÃO, como observou alguém que meditou sobre o assunto, já que é um pecado que, dentre todos, costumava despertar a ira até dos incréus, sendo incomparável com o falso testemunho, a gula ou mesmo a atividade sexual livre entre pessoas de sexos opostos), mas essa maldição religiosa lançada sobre um tema não pode entrar aos berros num grêmio de legisladores que deveria acompanhar o movimento da sociedade auscultando suas forças e tendências. Há religiosos e ateus que odeiam atos homoafetivos e consideram os africanos uns amaldiçoados, mas isso não representa o movimento da sociedade como um todo. As pesquisas na maioria dos países do Ocidente (inclusive o Brasil) não dizem isso. E, mais importante, para além do aspecto democrático dessas auscultações, há de haver princípios de direitos inegociáveis, como é o direito de igualdade de respeito e de oportunidades. É simplesmente grotesco que um religioso que fala em tom tão fanático se eleja presidente de uma comissão que deveria proteger os que têm carência de respeitabilidade e de oportunidades.
Espero que a menção feita por Marina Silva, a quem tanto admiro, à troca “de um preconceito pelo outro”, no caso da discussão sobre a presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, não signifique que opor-se à escolha de Feliciano, nos termos em que o faço, é uma mera troca de preconceitos. Contra quê, aliás, seriam os preconceitos de quem discute a escolha? Contra evangélicos? Contra pastores? Contra religiosos em geral? Sim, sem dúvida há. Vejo em filmes e piadas de TV, em conversas e em textos publicados, intolerância contra a vitalidade com que as igrejas neopentecostais se impõem no Brasil. A hipocrisia dos pregadores, a ganância de dinheiro, enfim, tudo o que se pode apontar em toda organização religiosa é quase sempre o aspecto ressaltado. Mas eu nunca me identifiquei com essa atitude. Vejo o crescimento das igrejas evangélicas como uma forma de progresso no nosso caminho para onde devemos ir. Não admiti nunca as campanhas anticandomblé que elas alardeavam. Mas isso serenou. Religião é assunto imenso. Leio Mangabeira. Penso. Acompanho pessoas íntimas que são profundamente religiosas. Umas católicas, outras evangélicas e ainda outras espíritas ou candomblezeiras. Eu próprio não sigo religião. Mas, mesmo que seguisse, teria de entender que Comissão de Direitos Humanos deve tratar dos temas pertinentes de modo não sectário.
Será que o Brasil, além do mini-PIB, terá que passar agora por papagaiadas como essas? São muitas maluquices que podem atrasar nossa caminhada. Ao contrário do que diz Feliciano, o continente africano está se erguendo. O Brasil, tão cheio de promessas desde sempre, será que vai ficar entalado?
Pelo menos Marta viu a luz.
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