Por Silvio Melgarejo - Festejam
Globo, Veja, Folha e Estadão, a condenação de José Dirceu, José Genoíno, João
Paulo Cunha e Delúbio Soares, pelo STF. Comemoram, note-se, com especial entusiasmo a
condenação de Dirceu. É que julgam ser a decisão recentemente anunciada pelos
ministros daquela corte o ponto final da história política de um dos mais
importantes e, por isso mesmo, mais odiados líderes do partido de esquerda mais
odiado, porque mais temido, pela direita brasileira, o Partido dos
Trabalhadores.
Desejam ardentemente os dirigentes-donos desses verdadeiros partidos
informais midiáticos que a condenação de Dirceu, Genoíno, Cunha e Delúbio,
torne-se uma mancha perpétua na história do PT, motivo de vergonha para seus
eleitores e militantes, a ser apontada e eficazmente explorada nas disputas
eleitorais. Prá desespero deles e de seus colunistas-militantes, nem uma coisa, nem outra aconteceu ou vai acontecer. Nem Dirceu
está morto politicamente, nem a militância petista baixou ou baixará a cabeça
ante seus inimigos. Os petistas, ao contrário, cada vez mais numerosos, têm um orgulho
imenso da história do Partido dos Trabalhadores, dos dois governos de Lula e do
atual governo de Dilma; e depois de terem acompanhado o julgamento de seus antigos
dirigentes, tiveram mais do que reforçada a certeza de que eles são realmente inocentes
das acusações que lhes foram imputadas.
A
condenação sem provas de José Dirceu, alvo principal da ira anti-petista na
Ação Penal 470, de José Genoíno, João Paulo Cunha e Delúbio Soares, não é uma
mancha na história do PT. É uma mancha na história do próprio STF que demonstra o quanto ainda precisam ser aperfeiçoadas as instituições democráticas brasileiras. Quem acompanhou, com um mínimo de isenção, o
desenrolar dos debates no tribunal, pela TV ou pela internet, tomando ciência
dos argumentos apresentados pela defesa e pela acusação, bem como das tortuosas
e frágeis justificativas dos ministros para os seus votos, só pode concluir que
Dirceu e os demais réus não tiveram o julgamento justo que todos os brasileiros
desejávamos.
Demonizado
pelos partidos midiáticos em quase uma década de furiosa e infame campanha de
destruição de sua imagem, José Dirceu tem caminhado desde 2005 até aqui
sozinho, sofrendo os ataques covardes das maiores e mais poderosas empresas de
comunicação do país. Desde 2005, ele já fora condenado pela Globo e demais
órgãos da imprensa oposicionista partidarizada. O veredicto repetido a partir
de então, de modo sistemático, pelos porta-vozes destes órgãos, sem a garantia
do justo e democrático contraditório, possibilitou o estabelecimento da crença
em sua culpabilidade nos setores da opinião pública menos atentos e menos
afeitos ao exercício da análise crítica dos conteúdos jornalísticos.
Criou-se
desse modo, artificialmente, o ambiente social mais favorável possível à sua
condenação na mais alta corte do país. Uma turma de juízes pusilânimes,
vaidosos e irresponsáveis, garantiu o desfecho antecipado e exigido pelos
partidos midiáticos, valendo-se das mais exdruxulas e controversas doutrinas
jurídicas para tentar em vão justificar a limitação do direito de defesa, a
inversão do ônus da prova, o desrespeito à presunção de inocência e a
escandalosa condenação sem provas, baseada somente em indícios e deduções.
O
desrespeito aos princípios mais fundamentais do direito, conhecidos até pelo
mais leigo dos cidadãos, foi perpetrado à luz dos holofotes, diante das câmeras
da TV Justiça, transmitido em tempo real para todo o Brasil, cumprindo com
rigor um calendário meticulosamente preparado para permitir o que só os tolos
admitem poder ser casual: que os réus petistas tenham sido julgados exatamente
nas semanas do 1º e do 2º turno das eleições municipais. O presidente da corte,
Aires Britto, não fez questão de esconder o esforço para que isso ocorresse. E
o procurador Gurgel chegou a afirmar com todas as letras que gostaria mesmo que
o resultado do pleito fosse influenciado pelas condenações.
As
capas das publicações impressas dos partidos midiáticos oposicionistas e os
discursos de seus colunistas-militantes expressaram exultante aprovação à
confirmação de suas teses pelos respeitáveis e até então insuspeitos ministros
da suprema corte. Vislumbram nesse endosso, Globo, Veja, Folha e Estadão, a
possibilidade de recuperarem um pouco da credibilidade perdida em anos de
corrupção do bom jornalismo. Mas, sobretudo, uma outra possibilidade
vislumbram, a de usar a decisão dos juízes como material de propaganda contra o
partido de esquerda tri-campeão em eleições presidenciais.
Precipitam-se
os anti-petistas e sua imprensa comemorando uma vitória que, a meu ver, é
apenas aparente. O triunfo obtido no Supremo tem tudo para provocar efeito
inverso ao que esperam. Digo isso porque desde o início do julgamento venho
lendo na internet manifestações de qualificados e experientes observadores
apontando, entre indignados e preocupados, erros e incoerências graves dos
ministros do Supremo, cujas implicações altamente negativas podem, segundo eles,
ir muito além de uma, por si só, lamentável condenação de inocentes. Nota-se
que não há, de fato, consenso nos meios jurídicos e jornalísticos de que o
processo tenha ocorrido de forma regular. Há, ao contrário, muitas e bem
fundamentadas críticas ao modo como tem sido conduzido, despertando e
alimentando a convicção de amplos setores da opinião pública de que,
pressionados pela mídia, os ministros deixaram de lado o direito e protagonizaram
um julgamento meramente político.
O STF
condenou João Paulo Cunha por corrupção passiva sem apresentar à sociedade
nenhuma prova de que ele tenha influído no processo licitatório que levou à
contratação da agência publicitária de Marcos Valério pela Câmara Federal, no
período em que a presidia. E condenou Dirceu, Genoíno e Delúbio por
corrupção ativa e formação de quadrilha, sem apresentar uma prova sequer de que
tenha havido a compra de votos de que são acusados. Pior que isso, as provas
apresentadas pelas defesas dos acusados não foram sequer contestadas, foram,
isto sim, solenemente ignoradas. Não convenceu, por isso, o STF, ao conjunto da sociedade brasileira –
como era de se esperar que fizesse, principalmente por se tratar de um
julgamento público tão divulgado e esperado – da procedência das
justificativas apresentadas para a condenação daqueles líderes petistas. É
grande, por conta disso, a desconfiança e o inconformismo na opinião pública.
Há um sentimento e uma convicção, especialmente entre militantes e eleitores do
PT, mesmo entre os que, como eu – filiado ao partido –, sempre discordaram das
posições de Dirceu, de que ele, Genoíno, João Paulo e Delúbio Soares estão
sendo condenados por crimes que não foram provados sequer em sua materialidade,
de que estão sendo vítimas de um golpe político que tem Lula e o Partido dos
Trabalhadores como alvos.
Dirceu,
dos quatro injustiçados, desde o eclodir das denúncias, o mais politicamente
ativo, malgrado o desejo de seus inimigos, ganhou uma vitalidade e uma força
políticas ainda maiores depois que o julgamento tomou seus contornos
definitivos. Com isso não deviam contar os inimigos do PT. Se tiverem, ele,
Dirceu, e os outros petistas, que cumprir pena com privação de liberdade,
muitos, na opinião pública, os considerarão presos políticos, porque têm a
nítida percepção de que foram exclusivamente políticas as motivações dos que os
condenaram. Por serem petistas foram condenados e por mais nenhuma outra razão
além desta. A simples comparação do tratamento dado a eles, tanto pelo
Ministério Público Federal quanto pelo STF, com o tratamento dispensado aos
suspeitos e réus do mensalão do PSDB, evidencia o critério político a favorecer
os operadores e beneficiários do ‘valerioduto’ tucano, em tudo igual ao petista.
Dirceu,
Genoíno, Delúbio e João Paulo, massacrados sem chance de defesa por partidos
midiáticos como a Globo, foram julgados publicamente e finalmente puderam
apresentar à sociedade respostas às acusações e provas de suas inocências. Os
argumentos usados em suas defesas foram infinitamente mais consistentes do que
os apresentados pelos acusadores. Condenados por juízes mais empenhados em
destruir inimigos do que em fazer justiça em nome da sociedade, Dirceu,
Genoíno, João Paulo e Delúbio, foram absolvidos por importante parcela da
opinião pública, que passa doravante a considera-los vítimas de uma feroz campanha
política que extrapolou os limites impostos pelas regras do jogo democrático, e
feriu gravemente um dos fundamentos mais
importantes da democracia que é o das garantias individuais inscritas na
Constituição. As maiores vítimas deste julgamento tão cheio de falhas não foram,
portanto, nenhum dos réus condenados sem provas, nem aqueles que através deles
se pretendeu atingir, que são Lula e o PT. As maiores vítimas desse julgamento foram a própria justiça e a democracia brasileira. Porque, diante dos olhos da sociedade, a Constituição
do país foi desrespeitada, e desrespeitada exatamente por aqueles que tem a
missão de defendê-la.
O que
se viu e o que se tem visto é que a Suprema Corte do Brasil curvou-se, servil e
obediente, à Suprema Mídia, detentora exclusiva do poder de criar e destruir
reputações. Tremem os ministros, por certo, diante do poder potencialmente
devastador concentrado nas mãos de Roberto Irineu Marinho, presidente das
Organizações Globo. Ou, pior que isso, sentem-se, com certeza,
irresistivelmente seduzidos diante da possibilidade de ser por ele
homenageados, tratados como heróis e até deuses diante do povo. A soberba dos
ministros do Supremo só não é maior do que a sua vaidade. Por tributos a ela,
parecem ter vendido seus votos, numa espécie de mensalão em que a bajulação é
moeda de propina.
Por
não terem tido um julgamento justo, Dirceu, Genoíno, João Paulo e Delúbio,
ganham a solidariedade de toda a militância petista e de expressiva parcela da
opinião pública não petista. O PT, vencedor inconteste das presentes eleições
municipais, a despeito de toda a propaganda negativa sofrida, nunca esteve tão
unido e fortalecido como agora. Se havia dúvidas sobre a inocência de seus
antigos dirigentes quanto as acusações que lhes foram imputadas, essas dúvidas
foram inteiramente dirimidas pelo próprio Procurador Geral da República,
Roberto Gurgel, pelo relator, ministro Joaquim Barbosa, pelo revisor, Ricardo
Lewandovisk, e pelos demais ministros do STF. Porque mesmo quando votaram pela
condenação dos réus, suas justificativas pediam a absolvição, tamanha era a
carência de elementos realmente comprobatórios das hipóteses engendradas.
A
discurseira vazia do procurador e a performance teatral, por vezes patética,
dos ministros acusadores só serviu para conduzir os observadores sinceramente
interessados em que se fizesse justiça à conclusão inescapável de que não houve
mesmo compra de votos, de que Delúbio Soares não mentiu quando afirmou na CPMI
dos Correios, e depois, em juízo, que o ‘valerioduto’ era um esquema de caixa 2
e que os repasses de dinheiro aos parlamentares, do seu e de outros partidos,
destinavam-se ao pagamento de dívidas de campanha. A abundância retórica e a
eloquência virulenta dos ministros daquela corte suprema, são índices de uma
enorme vontade de condenar os réus, mas não foram suficientes para disfarçar,
perante a parcela da sociedade mais civilizada, comprometida com a justiça, com
a verdade e com o direito, a ausência absoluta de provas que fundamentassem a
acusação de compra de votos.
Tratados
como bandidos durante anos, Dirceu, Genoíno, Delúbio e João Paulo, saem do
julgamento injusto a que foram submetidos, como vítimas do poder paralelo,
ilegítimo e ilimitado, das Organizações Globo, de Roberto Irineu Marinho, que
influenciaram de modo grosseiro e ostensivo os procedimentos, os discursos e os
votos equivocados da maioria dos magistrados. A vergonhosa submissão do STF à
vontade do supremo midiático Marinho é mais uma mancha na história daquela
corte e nas biografias de seus ministros, com a honrosa exceção do bravo e
esforçado Lewandovisk.
Ficou
patente, neste como em outros casos, a ascendência do oligopólio das empresas
de comunicação sobre os três poderes da República, num desequilíbrio de forças
que representa clara e permanente ameaça à democracia, ao chamado Estado
Democrático de Direito. Supremo, por ilimitado, tem sido o poder da Globo,
razão pela qual é preciso, é urgente, que sejam retomadas as mobilizações pela
votação no Congresso de um novo Marco Regulatório das Comunicações, que proporcione
ao poder executivo os meios legais de dar cumprimento à proibição
constitucional do monopólio e do oligopólio neste setor, de modo a
democratizá-lo, através da garantia da livre expressão da pluralidade e da
diversidade existentes na sociedade, que tem sido sufocadas pela concentração
dos meios de comunicação nas mãos de algumas poucas famílias. Só assim será
possível dar cumprimento a outro preceito constitucional frequentemente
desrespeitado por detentores de concessões de rádio e TV, como Roberto Irineu
Marinho: o direito democrático do cidadão à informação.
A
luta pela democratização das comunicações deve ganhar um novo e, quem sabe, até
decisivo impulso com as prováveis prisões de Dirceu, Genoíno, João Paulo e
Delúbio Soares. De dentro de suas celas, estes homens serão fonte abundante de
inspiração para os verdadeiros combatentes da causa social e democrática, como
foram no passado outros mártires. O injusto, violento e arbitrário sacrifício
de suas liberdades será como chaga aberta na consciência de quantos
compartilhem dos ideais pelos quais eles foram condenados.
O
homem justo, que já sofre e se revolta ante a simples perspectiva ou suspeita
de uma injustiça, sofre e revolta-se ainda mais quando a injustiça se consuma
de modo claro ante seus olhos. Não há de ser em vão, portanto, o martírio em
vida – desde 2005 e a partir de agora no cárcere – daqueles companheiros. Em
nome deles, vítimas mais recentes e conhecidas do poder sem regras e sem
limites do oligopólio das comunicações, liderado pelas Organizações Globo, é
que a militância do PT deve exigir das direções e dos parlamentares do partido
a imediata retomada das mobilizações sociais pela votação no Congresso do novo
marco regulatório das comunicações. Se a militância do Partido dos Trabalhadores
não tiver essa atitude e se nossos dirigentes e parlamentares não a encamparem,
será em vão o sacrifício da liberdade dos companheiros agora condenados.
Por
isso, eu me dirijo agora aos militantes e simpatizantes do Partido dos Trabalhadores e lhes digo com a mais absoluta segurança. Não é hora de se lamentar, nem de se queixar. É hora de agir. É hora de lutar. Não vamos permitir que, encorajadas pela vitória no Supremo e por nossa apatia e imobilismo, as forças da direita, eleitoralmente derrotadas, deem curso ao projeto de voltar ao poder via golpes
judiciários como os que depuseram os presidentes de Honduras e Paraguai, e como
este que acabamos de testemunhar agora no Brasil. Dirceu, Genoíno, Delúbio e
João Paulo serão presos políticos. É assim que os devemos considerar e é isso o
que temos que denunciar ao povo brasileiro e à opinião pública internacional. O
Brasil voltou a ter presos políticos, como no tempo da ditadura. E não há
porque duvidar de que os próximos alvos dos golpistas são o ex-presidente Lula
e a presidenta Dilma Rousseff.
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