segunda-feira, 18 de abril de 2011

Sobre o ato de escrever.

Por Silvio Melgarejo - Toda experiência que vivo é matéria prima preciosa que, submetida à reflexão, pode ensinar coisas que ninguém, nem livro algum, pode ensinar. Escrever obriga a pensar. Entregar-me à reflexão sobre o que vivo e observo e ao trabalho de relatar a experiência, a reflexão e as descobertas dela provenientes, lutando contra minhas limitações e insuficiências para traduzi-las da forma mais bela e clara que me seja possível, é uma necessidade e ao mesmo tempo um desafio que encaro como missão, toda vez que me dedico a esta tarefa. É como ter fome e ver-se impelido a procurar comida; como ter sede e procurar por água. Até achar.

Lutar com a experiência e com as palavras para delas extrair significado e beleza é um trabalho sofrido, a maior parte das vezes frustrante, mas sempre excitante. Há uma expectativa constante pelo eclodir do entendimento e pelo desabrochar da melhor forma de expressá-lo. Diante do papel ou do teclado, as lembranças, idéias e palavras parecem envolver com o ritmo acelerado de seu movimento todo meu corpo e toda minha alma, de tal modo que a noção de espaço e tempo se perdem, em alguma medida, ou entram num estado de completa suspensão. Só a fadiga mental e o esgotamento físico me despertam desse transe e me obrigam a interromper, frustrado, a busca que me imponho qual missão.

Durmo sem dormir direito e prossigo quando acordo com o empenho angustiado de um cego a procurar por luz. Tudo é dor, angústia e treva e ainda assim caminho, certo do valor da recompensa que me espera se chegar vivo ao meu destino. E não há, não pode haver prazer maior do que o momento em que essa tensão desfaz-se... e se desatam os nós... o peito suspira, aliviado... em que a cabeça fica subitamente leve... a alma se alegra, se delicia... o corpo relaxa e, finalmente... dorme em paz.

Isso tudo sinto quando termino um texto que me parece bom, quando termino um texto que me dá a sensação de ter encontrado a forma certa de dizer tudo o que tinha a dizer. É possível que, um dia, ao reler o que hoje me satisfaz, eu me envergonhe de mim mesmo por ter encontrado valor nas bobagens que pensei e escrevi e me considere um completo idiota por ter tido a coragem de publicá-las. Mas é possível, também, que eu aprove, e me orgulhe tanto do que fiz que chegue a duvidar de ter sido eu mesmo o autor.

Seja como for, acho que terá valido a pena correr o risco de passar esse vexame. Por duas razões. Primeiro, porque me terei permitido ver a mim mesmo como me veem os outros, ver-me de fora de mim e poder avaliar com algum distanciamento o valor daquilo que faço, do meu pensamento profundo, como às vezes suponho, ou raso, como outras vezes penso que seja. Ver, sobretudo, a evolução das minhas ideias e da minha capacidade de expressa-las.

A outra razão para eu achar que vale a pena encarar o risco do ridículo é que, expondo-me, sujeito-me à crítica que pode ajudar a identificar os eventuais vícios do meu raciocínio, possibilitando a retificação de possíveis erros, contradições e incoerências.

Busco a verdade, o bem, a justiça e a beleza, e quero muito compartilhar com os outros essa minha busca e seus resultados. Escrevo, a princípio, para organizar o pensamento e para dar-lhe registro perene. Mas quero também dar publicidade ao que penso para que minhas ideias se espalhem, sejam objeto de crítica e inspirem ações que lhes correspondam. Porque sei que o que procuro e o que desejo, nunca acharei nem farei sozinho. Acharei e farei com os outros. Quero pensar e escrever para mim, para os outros e com outros. Por isso criei este blog.

Silvio Melgarejo


(Escrito em 01/10/2007 - Revisado em 22/12/2011, em 27/10/2012 e em 02/09/2013. Última revisão 08/03/2015)



Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.