segunda-feira, 18 de abril de 2011

Cristianismo de Jesus: Os dois maiores mandamentos.

O Cristianismo é a doutrina moral de Jesus Cristo. Nada além ou aquém disso. Num diálogo que teve com os fariseus, Jesus definiu, de forma muito precisa e objetiva, o núcleo central, a base fundamental sobre a qual se assentava a sua doutrina. Ele cita dois mandamentos, que já se encontravam em livros do Antigo Testamento, a partir dos quais desenvolve todo o seu ensino. Esse diálogo foi relatado pelos evangelistas Mateus, Marcos e Lucas.
Evangelho de Mateus, capítulo 22, versículos 34 a 40. 
"Sabendo os fariseus que Jesus reduzira ao silêncio os saduceus, reuniram-se, e um deles, doutor da lei, fêz-lhe esta pergunta para pô-lo à prova: '- Mestre, qual é o maior mandamento da lei?' Respondeu Jesus: '- Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda tua alma e de todo o teu espírito (Deutoronômio, capítulo 6, versículo 5). Este é o maior e o primeiro mandamento. E o segundo, semelhante a este, é: Amarás teu próximo como a ti mesmo (Levítico, capítulo 19, versículo 18). Nesses dois mandamentos se resumem toda a lei e os profetas.'"
Evangelho de Mateus, capítulo 7, versículo 12 (Sermão da Montanha).
"Tudo o que quereis que os homens vos façam, fazei-o vós a eles. Esta é a lei e os profetas."


Evangelho de Marcos, capítulo 12, versículos 28 a 31.
"Achegou-se dele um dos escribas que os ouvira discutir e, vendo que lhes respondera bem, indagou dele: '- Qual é o primeiro de todos os mandamentos?' Jesus respondeu-lhe: '- O primeiro de todos os mandamentos é este: Ouve, Israel, o Senhor, nosso Deus, é o único Senhor; amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todo o teu espírito e de todas as tuas forças. Eis, aqui, o segundo: Amarás o teu próximo como a ti mesmo.* Outro mandamento maior do que estes não existe.'"


* (Citação de Deutoronômio, capítulo 6, versículos 4 e 5; e Levítico, capítulo 19, versículo 18)


Evangelho de Lucas, capítulo 10, versículos 25 a 37. 
"Levantou-se um doutor da lei e, para pô-lo à prova, perguntou: '- Mestre, que devo fazer para possuir a vida eterna?' Disse-lhe Jesus: '- Que está escrito na lei? Como é que lês?' Respondeu ele: '- Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todas as tuas forças e de todo o teu pensamento (Deutoronômio, capítulo 6, versículo 5); e a teu próximo como a ti mesmo (Levítico, capítulo 19, versículo 18).' Falou-lhe Jesus: '- Respondeste bem; faze isso, e viverás.'"


Evangelho de Lucas, capítulo 6, versículo 31. 
"Tratai todos os homens como quereríeis que eles vos tratassem."
Amar a Deus sobre todas as coisas e amar ao próximo como a si mesmo. Disse Jesus sobre estes dois preceitos: "Nesses dois mandamentos se resumem toda a lei e os profetas"; "outro mandamento maior do que estes não existe"; e "faze isso, e viverás". Os relatos evangélicos não dão margem a dúvidas. A doutrina de Jesus se resume, segundo Ele próprio declarou, a estes dois mandamentos: amar a Deus sobre todas as coisas e amar ao próximo como a si mesmo. Nesses dois mandamentos consiste, portanto, o verdadeiro Cristianismo de Jesus. Um Cristianismo cujo ensinamento essencial é perfeitamente condizente com a intuição que boa parte da humanidade tem da existência de um Deus justo e bom, cujo amor e piedade paternais só podem inspirar mais amor e piedade fraternais entre seus filhos, e não o longo cortejo de crueldades e impiedades em nome Dele cometidas, ao longo de toda a História.

Muito mal se há feito - e ainda se faz - em nome de Deus por se atribuir a Deus o que partiu - e parte - da mente sórdida dos homens. Em Gênesis, diz-se que Deus criou o homem à sua imagem e semelhança. Os ateus afirmam que Deus é uma mentira, uma idéia criada e alimentada pela imaginação do próprio homem. Prá mim, Deus existe independentemente da vontade dos homens. Mas, de fato, cada homem cria um deus seu, à sua própria imagem e semelhança.

O leitor há de ainda estar se perguntando o porque de eu ter dado a este post o título de "Cristianismo de Jesus"; acaso haveria outro ou outros cristianismos além deste?

Dentro da Bíblia, a doutrina de Jesus vem misturada com outras doutrinas que dela divergem de modo por vezes radical. Há contradições gritantes entre a essência do ensino de Jesus e a doutrina ensinada por alguns profetas e até apóstolos que falam em nome Dele e relatam a Sua história. Dentro mesmo do Novo Testamento, há pelo menos uma afirmativa atribuída a Jesus que é tão escandalosamente injusta que não poderia jamais ter sido feita por Ele.
"Eu, porém, vos digo: todo aquele que rejeita sua mulher, a faz tornar-se adúltera, a não ser que se trate de matrimônio falso; e todo aquele que desposa uma mulher rejeitada comete um adultério." (Mateus 5,32) 
http://www.bibliacatolica.com.br/01/47/5.php


"Ora, eu vos declaro que todo aquele que rejeita sua mulher, exceto no caso de matrimônio falso, e desposa uma outra, comete adultério. E aquele que desposa uma mulher rejeitada, comete também adultério." (Mateus 19,9) 
http://www.bibliacatolica.com.br/01/47/19.php

Ou seja, a mulher que sofre o abandono do marido, torna-se por isso adúltera e é condenada à pena de solidão perpétua. O homem, por sua vez, que a encontrar sozinha, não poderá desposá-la, fazer dela sua companheira, por mais que a ame e por ela seja amado, porque que isso faria dele também um adúltero. É inconcebível, por ilógico e incoerente, que Jesus tenha ensinado um absurdo desses. E, no entanto, isso está lá, com todas as letras, no evangelho de Mateus.

Apesar de evidentes aberrações éticas como essa, as religiões bíblicas (católicos e protestantes), ensinam a seus fiéis que tudo o que a Bíblia contém é Cristianismo. Não é. São Paulo, por exemplo, tem uma doutrina própria, que poderia ser chamada de "paulinismo", que tem pontos de contato com o Cristianismo, mas também pontos em que com o Cristianismo mostra completo desacordo. Chamam de Cristianismo também às interpretações mirabolantes e aos dogmas criados pelos teólogos do próprio clero, penduricalhos inúteis que ao longo dos séculos foram se acumulando e tomando um tal volume que acabaram por ocultar o ensino original Daquele que todas as religiões cristãs dizem ter como Mestre.

A doutrina de Jesus é simples. O que dificulta a sua compreensão e o que causa a sua frequente deturpação, é a confusão enorme que se cria ao chamar de Cristianismo o que não é Cristianismo. A moral cristã é diferente e muito superior à moral encontrada em muitos dos sermões que se fazem nos púlpitos e em um sem número de passagens bíblicas. Por isso, quando alguém se diz adepto do Cristianismo, é justo que se pergunte: que cristianismo? O cristianismo que erradamente se atribui aos profetas do Antigo Testamento? O cristianismo que erradamente se atribui a São Paulo, exposto em suas epístolas? O cristianismo de um suposto Jesus injusto que condena e penaliza a mulher pelo pecado do homem? O cristianismo do clero católico e protestante que estabelece normas e preceitos muitas vezes contrários à caridade ensinada por Jesus? Ou o Cristianismo puro, de Jesus, resumido por Ele mesmo quando provocado pelos fariseus? A verdade é que só existe um Cristianismo: o de Jesus. O resto é produto da imaginação humana que só serve para alimentar confusão e incredulidade.

Há um jeito simples de saber o que é e o que não é cristão, o que é e o que não é Cristianismo. Tudo apreciar e julgar à luz do que o próprio Jesus asseverou ser o fundamento de Sua doutrina, que é a própria Lei de Deus. Jesus citou dois mandamentos que já constavam das antigas escrituras: amar a Deus sobre todas as coisas e amar ao próximo como a si mesmo. E disse, sobre eles: "outro mandamento maior do que estes não existe". Isso quer dizer que existem outros mandamentos além destes. Mas que todos têm um valor relativo inferior, que é determinado pelo grau de compatibilidade que tenham com eles. Deu-nos, portanto, Jesus, um meio infalível de avaliar o que é e o que é Cristianismo. Cristão é todo ensino moral que esteja de acordo, ou seja compatível, com aqueles dois mandamentos supremos, mesmo que estes ensinos não apareçam na Bíblia. Pela mesmo critério, anticristão é todo ensino moral que esteja em desacordo, ou seja incompatível, com aqueles dois mandamentos supremos, mesmo que estes ensinos estejam na Bíblia e sejam atribuídos a Deus ou a Jesus.

Se Deus é perfeito, a Lei que Dele promana também deve o ser; não pode ser uma lei contraditória. Ora, quem já leu a Bíblia sabe que contradição é o que não falta nesse livro. Se tudo o que ali se atribui a Deus fosse mesmo palavra de Deus, teria-se que, forçosamente, concluir que Deus é um deus louco, incoerente e passional, como a maior parte dos homens. Mas Deus não é contraditório. Se há tantas contradições na Bíblia não é senão pelo fato de que ela foi inteiramente concebida pelos homens, que misturaram, inadvertida ou oportunisticamente, o ensino moral, universal e atemporal, de procedência divina, com o ensino moral, local e temporal, de procedência humana.

Atribui-se nos Evangelhos a Jesus a expressão 'dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus'. Pois a missão de Jesus pode bem ser resumida numa outra frase semelhante a essa. Jesus veio ao mundo dar a Deus o que é de Deus, e a Moisés e aos profetas o que é de Moisés e dos profetas. Usando uma outra expressão também atribuída a Ele pelos evangelistas, sua missão era separar o joio do trigo, separar o que era Lei de Deus do que era lei dos homens. Infelizmente esse propósito não foi compreendido por seus seguidores. Paulo de Tarso, o São Paulo, foi o primeiro a refazer a mistura do trigo com o joio, da Lei de Deus com a lei dos homens. Convertido ao Cristianismo de Jesus, mas ideologicamente ainda prisioneiro do judaísmo, no qual foi educado, Paulo deu ao Cristianismo de Jesus uma nova feição. Ele concebeu de fato um novo cristianismo, diferente do original, em que tentou harmonizar - a meu ver, sem sucesso - suas novas e antigas crenças. O Cristianismo está, de fato, presente no Mosaísmo e no Paulinismo, mas com eles não pode ser confundido, como frequentemente se faz. Isso é um equívoco. O Cristianismo, no Mosaísmo, é uma semente minúscula coberta por uma tonelada de cascalho e pedra. O Cristianismo, no Paulinismo, é uma planta tenra coberta de ervas parasitas.

O Cristianismo nada mais é do que a Lei de Deus ensinada por Jesus. A base dessa doutrina é o amor. Qualquer ensino religioso que tenha como conteúdo algo que não seja o amor, nunca poderá ser admitido como de natureza cristã.

Silvio Melgarejo

18/04/2011

Sobre o ato de escrever.

Por Silvio Melgarejo - Toda experiência que vivo é matéria prima preciosa que, submetida à reflexão, pode ensinar coisas que ninguém, nem livro algum, pode ensinar. Escrever obriga a pensar. Entregar-me à reflexão sobre o que vivo e observo e ao trabalho de relatar a experiência, a reflexão e as descobertas dela provenientes, lutando contra minhas limitações e insuficiências para traduzi-las da forma mais bela e clara que me seja possível, é uma necessidade e ao mesmo tempo um desafio que encaro como missão, toda vez que me dedico a esta tarefa. É como ter fome e ver-se impelido a procurar comida; como ter sede e procurar por água. Até achar.

Lutar com a experiência e com as palavras para delas extrair significado e beleza é um trabalho sofrido, a maior parte das vezes frustrante, mas sempre excitante. Há uma expectativa constante pelo eclodir do entendimento e pelo desabrochar da melhor forma de expressá-lo. Diante do papel ou do teclado, as lembranças, idéias e palavras parecem envolver com o ritmo acelerado de seu movimento todo meu corpo e toda minha alma, de tal modo que a noção de espaço e tempo se perdem, em alguma medida, ou entram num estado de completa suspensão. Só a fadiga mental e o esgotamento físico me despertam desse transe e me obrigam a interromper, frustrado, a busca que me imponho qual missão.

Durmo sem dormir direito e prossigo quando acordo com o empenho angustiado de um cego a procurar por luz. Tudo é dor, angústia e treva e ainda assim caminho, certo do valor da recompensa que me espera se chegar vivo ao meu destino. E não há, não pode haver prazer maior do que o momento em que essa tensão desfaz-se... e se desatam os nós... o peito suspira, aliviado... em que a cabeça fica subitamente leve... a alma se alegra, se delicia... o corpo relaxa e, finalmente... dorme em paz.

Isso tudo sinto quando termino um texto que me parece bom, quando termino um texto que me dá a sensação de ter encontrado a forma certa de dizer tudo o que tinha a dizer. É possível que, um dia, ao reler o que hoje me satisfaz, eu me envergonhe de mim mesmo por ter encontrado valor nas bobagens que pensei e escrevi e me considere um completo idiota por ter tido a coragem de publicá-las. Mas é possível, também, que eu aprove, e me orgulhe tanto do que fiz que chegue a duvidar de ter sido eu mesmo o autor.

Seja como for, acho que terá valido a pena correr o risco de passar esse vexame. Por duas razões. Primeiro, porque me terei permitido ver a mim mesmo como me veem os outros, ver-me de fora de mim e poder avaliar com algum distanciamento o valor daquilo que faço, do meu pensamento profundo, como às vezes suponho, ou raso, como outras vezes penso que seja. Ver, sobretudo, a evolução das minhas ideias e da minha capacidade de expressa-las.

A outra razão para eu achar que vale a pena encarar o risco do ridículo é que, expondo-me, sujeito-me à crítica que pode ajudar a identificar os eventuais vícios do meu raciocínio, possibilitando a retificação de possíveis erros, contradições e incoerências.

Busco a verdade, o bem, a justiça e a beleza, e quero muito compartilhar com os outros essa minha busca e seus resultados. Escrevo, a princípio, para organizar o pensamento e para dar-lhe registro perene. Mas quero também dar publicidade ao que penso para que minhas ideias se espalhem, sejam objeto de crítica e inspirem ações que lhes correspondam. Porque sei que o que procuro e o que desejo, nunca acharei nem farei sozinho. Acharei e farei com os outros. Quero pensar e escrever para mim, para os outros e com outros. Por isso criei este blog.

Silvio Melgarejo


(Escrito em 01/10/2007 - Revisado em 22/12/2011, em 27/10/2012 e em 02/09/2013. Última revisão 08/03/2015)



Inauguração do blog.

"Ser blogueiro significa, prá mim, ter a dupla possibilidade de exercitar a redação e exercer a cidadania. Estou certo, de que se ninguém além de mim sequer tomar conhecimento da existência deste meu blog, ele ainda assim já terá tido uma virtude, a de me dar ensejo ao convívio prazeroso com as palavras e com as idéias, com os conteúdos e com as formas de expressá-los. Escrever é atividade que exige reflexão. A palavra falada evapora no ar; a escrita dá-lhe forma visível e registro perene. A palavra escrita organiza o pensamento e permite que se identifique, mais facilmente, as virtudes e os vícios de uma argumentação. O primeiro leitor de um livro e o seu primeiro crítico é aquele mesmo que o escreve. Esse dialogo sempre algo tenso do leitor com o escritor, sendo ambos a mesma pessoa, é uma forma de reflexão. Refletir, nesse caso, é submeter-se à própria crítica; é botar em dúvida o valor de tudo o que se escreveu e buscar, no texto, a insuficiência, a imperfeição, a imprecisão, a incorreção, a incoerência. A dúvida, essa atitude tão necessária prá dar valor à auto-crítica, é o que mais gera insegurança e ansiedade no escritor; ao mesmo tempo, é o que mais lhe ajuda a depurar idéias e amadurecer o pensamento." (Silvio Melgarejo)

Antes de mais nada, é preciso que eu me apresente. Eu sou Silvio Melgarejo. Sou professor de música, brasileiro, carioca, nascido e criado no bairro de Botafogo, onde até hoje moro. Sou cristão espírita, democrata socialista, filiado ao Partido dos Trabalhadores e torço pelo Botafogo.

Bem, não é a primeira vez que crio um blog. Tive outros e, cada vez que inaugurava um novo, fazia um post em que procurava justificar o porque de estar criando um blog. Era uma espécie de discurso de cerimônia de abertura, um negócio um tanto formal, mas que mal não fazia. Por isso, quero fazer o mesmo aqui. Neste primeiro post de abertura, além de apresentar minhas boas vindas aos eventuais visitantes, quero contar-lhes um pouco da minha experiência na internet, como vim parar aqui e o que pretendo com a criação deste espaço.

Descobri o que era um blog em 2005. O primeiro que conheci foi o do jornalista Ricardo Noblat onde fiz meus primeiros apartes no debate político cibernético. Demorei um pouco prá decidir se escrevia ou não alguma coisa, tinha medo de dizer besteira. Mas era tanta gente falando bobagem, livre e impunemente, que eu me senti encorajado a também proferir as minhas. Evidentemente ninguém considera bobagens as bobagens que diz. Senão nem as publicaria. Eu achava que o que eu escrevia era melhor do que o que maioria publicava, e isso me dava a sensação de estar ajudando a elevar o nível, não fazê-lo despencar. Eram, afinal, frutos do meu esforço de reflexão e de elaboração. Não publicava qualquer coisa, procurava caprichar prá contribuir com o melhor de mim para o debate em que entrava. A possibilidade de ser lido por muita gente me animava, me fazia reviver os bons tempos de sindicalista em que redigia o jornal da minha empresa. Aos poucos, no entanto, fui percebendo que se, por um lado, a quantidade e a disposição dos frequentadores do blog faziam dele uma assembléia com audiência certa para quem quisesse dar o seu recado, por outro, o número de postagens era tão grande que, em pouquíssimo tempo, um texto que demorasse horas prá ser redigido, perdia-se em meio aos demais, desaparecendo do mapa antes que pudesse ser lido por meia dúzia sequer de pessoas.

Dessa experiência no Blog do Noblat, aprendi o seguinte. Os blogs com alta frequência de visitantes seriam excelentes vitrines de idéias se fossem numerosos os leitores e poucos os tópicos e postagens. Quando os tópicos e postagens são criados em profusão, o tempo de exposição de cada um deles acaba ficando curtíssimo. A partir dessa constatação, me dei conta de que seria um desperdício de energia e de tempo trabalhar exaustivamente em textos que, misturados a milhões de outros, acabariam sendo fatalmente ignorados. Foi aí que pensei em que criar meu próprio blog. Pensava à época, e ainda penso, que um blog só meu talvez viva vazio, como uma dessas lojas escondidas em ruas de pouca circulação. Mas, ainda assim, será um endereço certo prá eu receber quem venha por recomendação de algum freguês bem atendido. E, quem passe eventualmente pela porta, a qualquer hora do dia ou da noite, não poderá deixar de ver o que esteja exposto na vitrine.

Pode parecer meio descabido comparar idéias a coisas que se compra e vende no comércio. Mas, de fato, a vida em sociedade, na medida em que põe os indivíduos em contato uns com os outros, faz com que naturalmente estabeleçam-se relações de troca. No Rio de Janeiro diz-se "dar uma idéia em Fulano" ou "trocar uma idéia com Beltrano" quando se quer dizer "falar com Fulano" ou "conversar com Beltrano". O que quero dizer é que a convivência social é, mesmo, um comércio permanente de sentimentos e de pensamentos, que existe, mesmo, um mercado de idéias, como existe, também, um mercado de afetos. Somos todos, ao mesmo tempo, produtores, comerciantes e consumidores de idéias e afetos. Expomos nossas idéias prá que outros delas se apropriem e façam uso, enquanto apreciamos, por nossa vez, nas vitrines dos outros, as suas idéias, e compramos aquelas que nos seduzem ou que apenas nos parecem úteis ou, de algum modo, apropriadas. Mas, afinal, prá que servirão essas idéias? E que gratificação terá aquele que as vende ou que apenas se dedica a fazê-las circular?

Não acho que seja possível ter perfeita e absoluta consciência das motivações íntimas de cada um dos nossos atos. A maior parte dessas motivações é latente, está lá dentro de nós, impulsionando-nos a agir dessa ou daquela forma, sem que tenhamos a menor consciência da sua existência. As intenções que mais facilmente revelamos, até para nós mesmos, mesmo quando reais, são quase sempre aquelas mais nobres que servem prá valorizar a nossa auto-imagem e a nossa imagem pública. É raro alguém admitir que faz alguma coisa movido por ambição ou vaidade. É difícil mesmo avaliar, ainda que se esteja muito disposto a ser honesto, o quanto de vaidade e o quanto de ambição estão misturados àqueles sentimentos nobres que apresentamos à sociedade como matrizes das nossas boas ações.

Não tenho porque negar que há vaidade na raiz da minha decisão de publicar o que escrevo. Ambição, não. Mas, conceber boas idéias e expressá-las de forma bela e clara na expectativa de receber a aprovação de quem lê é uma intenção que não chega a ser má; revela, talvez, a carência e a fragilidade de quem escreve e um tanto de egoísmo, já que visa antes à satisfação do seu amor próprio do que ao bem de outrem, embora esta intenção – é bom que se diga – não chegue a estar ausente. Mas se as idéias forem mesmo boas e se a forma como forem traduzidas for bonita e inteligível, se o trabalho que estou tendo puder ser útil a quem lê, ajudando-o a refletir ou simplesmente proporcionando-lhe algum prazer estético, que importa se tenho a vaidade como incentivadora?

Fato é que toda ação, ou movimento, nasce impulsionada por uma complexa combinação de desejos que são frequentemente contraditórios, uns acentuando, outros atenuando o vigor daquele que desde o começo mostra-se predominante sobre os demais. Impulsos de vida e de morte, de criação e destruição, de amor e egoísmo, conflagram-se na gênese das ações humanas, arbitrados pela lei, pela moral e pela conveniência. Por isso, o conhecimento de si mesmo pode ser encarado como a maior, a mais bela, a mais necessária e, sobretudo, a mais difícil das utopias humanas. Ninguém é tudo o que supõe ser de bom e de mau. O universo interior é cheio de enigmas, segrêdos e mistérios que, ao serem revelados, quase sempre nos aproximam, mais até do que desejamos, da humanidade que vemos à nossa volta e contra a qual temos tantas críticas. Gandhi demonstrava saber disso quando aconselhou aos que o seguiam: “sejam a mudança que vocês querem no mundo”. Com isso quis dizer que a mudança real começa no mundo íntimo de cada ser humano.

Portanto, as razões mais profundas que me animam a, não só criar o blog, como participar de inúmeros debates públicos na internet, não me atrevo a dizer que as conheço todas. Penso que este pode vir a ser um dos temas recorrentes desse blog, "por que faço política", "por que debato na internet", "por que criei o blog?". Com o tempo, é possível que eu chegue a conclusões mais precisas, mais consistentes, mais verdadeiras. Por ora, fico nas razões superficiais, naquelas mais fáceis de serem identificadas e admitidas. Pois, então, vamos a elas.

Bem, não são diferentes as minhas das razões da maioria dos blogueiros prá criar um blog. Creio que tudo se resuma à necessidade de comunicação, de tornar pública alguma coisa que se concebeu e que se deseja compartilhar com o maior número possível de pessoas. O que me levou a criar este blog é o desejo de dar publicidade aos textos que eu redija sobre qualquer coisa que me pareça relevante. Muita coisa me parece relevante mas há, devo dizer, um tema sobre o qual tenho um interesse maior e que me mobiliza mais que qualquer outro: a política. Além da política, a religião, os direitos humanos, o futebol e o bairro de Botafogo, onde moro, serão os temas deste meu blog. Ele será a minha tribuna particular. Daqui vou continuar, como tenho feito, em outros espaços, emitindo meus juízos sobre as idéias e sobre os fatos tentando contribuir com o melhor de mim prá enriquecer o debate público na sociedade. Não espero alcançar grandes audiências. Meu objetivo é bem modesto. Arquivar meus textos e disponibilizá-los para os eventuais interessados. Quanto mais gente, melhor, é claro. Mas, já estarei feliz se tiver alguns poucos e bons leitores com quem possa dialogar.

Ser blogueiro significa, prá mim, ter a dupla possibilidade de exercitar a redação e exercer a cidadania. Estou certo, de que se ninguém além de mim sequer tomar conhecimento da existência deste meu blog, ele ainda assim já terá tido uma virtude, a de me dar ensejo ao convívio prazeroso com as palavras e com as idéias, com os conteúdos e com as formas de expressá-los. Escrever é atividade que exige reflexão. A palavra falada evapora no ar; a escrita dá-lhe forma visível e registro perene. A palavra escrita organiza o pensamento e permite que se identifique, mais facilmente, as virtudes e os vícios de uma argumentação. O primeiro leitor de um livro e o seu primeiro crítico é aquele mesmo que o escreve. Esse dialogo sempre algo tenso do leitor com o escritor, sendo ambos a mesma pessoa, é uma forma de reflexão. Refletir, nesse caso, é submeter-se à própria crítica; é botar em dúvida o valor de tudo o que se escreveu e buscar, no texto, a insuficiência, a imperfeição, a imprecisão, a incorreção, a incoerência. A dúvida, essa atitude tão necessária prá dar valor à auto-crítica, é o que mais gera insegurança e ansiedade no escritor; ao mesmo tempo, é o que mais lhe ajuda a depurar idéias e amadurecer o pensamento.

No dia 20 de julho de 2005 inaugurei o meu primeiro blog, o Aparte, prá registrar e dar publicidade às minhas idéias sobre política. Nunca tive grandes pretensões em relação a ele, queria apenas que pudesse servir como um arquivo público onde deixasse registrados os meus pontos de vista sobre as idéias e sobre os fatos da vida pública do país. O blog seria um endereço certo na internet que eu poderia dar a quem quisesse conhecer meu pensamento. A idéia parecia muito boa, mas o projeto acabou não se concretizando. Eu não tinha tempo nem disposição prá divulgar o blog e produzir conteúdo que pudesse ser publicado. Acho que a falta de um público a quem pudesse me dirigir, já que tanto eu quanto minha página eramos absolutamente desconhecidos, matava em mim qualquer inspiração prá escrever, qualquer desejo de manifestar meu pensamento. Com mêdo de ficar isolado, escrevendo prá ninguém, de ficar falando sozinho, sem interlocutores, acabei deixando de lado o blog e fui pro Orkut, onde já havia movimento. Demorei a tomar essa decisão. Temia pela falta de segurança do sistema. A essa altura, eu já sabia dos perigos da internet e tinha medo de entrar numa enrascada. A idéia que tinha do Orkut era vaga. Soube que era um site e que ali havia fóruns de discussão prá todo tipo de assunto. E só. Não sabia como isto se dava. Enfim, resolvi arriscar, tomando, evidentemente, alguns cuidados prá me preservar. Um perfil falso, por exemplo.

Não demorei muito a perceber que aquele mesmo problema que tinha me feito abandonar os blogs de jornalistas, que frequentava lá no começo da minha militancia cibernética, aparecia ali também nas comunidades do Orkut. O problema da superprofusão de postagens, da efemeridade e da superficialidade das discussões e da alta rotatividade de tópicos. Enfim, aquilo tudo que me deixava mais insatisfeito nos blogs do Noblat e do Guilherme Fiuza, estava encontrando ali nas comunidades do Orkut que comecei a frequentar. Se por um lado a quantidade e a disposição dos participantes das comunidades faziam delas tribunas com platéias numerosas e prontas prá ouvir minhas mensagens, por outro essas mensagens acabavam tendo curtíssimo tempo de vida útil. E cá estou de novo ao ponto de partida, investindo num novo projeto de blog próprio. O Orkut continua sendo uma fonte de informação e de inspiração para escrever. Sinto-me provocado quando leio algo com que concorde ou com que discorde e lá mesmo respondo. O que não impede que publique o que lá deixo aqui no meu blog. Surgiram o Facebook e o Twitter, muita gente aposentou o Orkut, mas eu continuo achando que ele é melhor que os demais para a exposição e troca de idéias. Mantenho lá o meu perfil e sigo participando de debates sobre os temas que me interessam com a assiduidade possível.

Neste blog que inauguro agora, eu pretendo fazer um inventário das minhas crenças, reflexões e memórias, registrar notícias, análises e opiniões sobre os fatos do cotidiano da vida pública que me chamem mais a atenção; quero falar sobre moral, filosofia, religião, política e esporte; falar, enfim, sobre o comportamento humano, as relações sociais e o jogo do poder político. Quero fazer desse meu blog a minha sala virtual de visitas. Você, leitor, é meu convidado. Vamos conversar? Entre. Leia. Comente. Seja bem vindo.

Silvio Melgarejo

18/04/2011