Evangelho de Mateus, capítulo 22, versículos 34 a 40.
"Sabendo os fariseus que Jesus reduzira ao silêncio os saduceus, reuniram-se, e um deles, doutor da lei, fêz-lhe esta pergunta para pô-lo à prova: '- Mestre, qual é o maior mandamento da lei?' Respondeu Jesus: '- Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda tua alma e de todo o teu espírito (Deutoronômio, capítulo 6, versículo 5). Este é o maior e o primeiro mandamento. E o segundo, semelhante a este, é: Amarás teu próximo como a ti mesmo (Levítico, capítulo 19, versículo 18). Nesses dois mandamentos se resumem toda a lei e os profetas.'"
Evangelho de Mateus, capítulo 7, versículo 12 (Sermão da Montanha).
"Tudo o que quereis que os homens vos façam, fazei-o vós a eles. Esta é a lei e os profetas."
Evangelho de Marcos, capítulo 12, versículos 28 a 31.
"Achegou-se dele um dos escribas que os ouvira discutir e, vendo que lhes respondera bem, indagou dele: '- Qual é o primeiro de todos os mandamentos?' Jesus respondeu-lhe: '- O primeiro de todos os mandamentos é este: Ouve, Israel, o Senhor, nosso Deus, é o único Senhor; amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todo o teu espírito e de todas as tuas forças. Eis, aqui, o segundo: Amarás o teu próximo como a ti mesmo.* Outro mandamento maior do que estes não existe.'"
* (Citação de Deutoronômio, capítulo 6, versículos 4 e 5; e Levítico, capítulo 19, versículo 18)
Evangelho de Lucas, capítulo 10, versículos 25 a 37.
"Levantou-se um doutor da lei e, para pô-lo à prova, perguntou: '- Mestre, que devo fazer para possuir a vida eterna?' Disse-lhe Jesus: '- Que está escrito na lei? Como é que lês?' Respondeu ele: '- Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todas as tuas forças e de todo o teu pensamento (Deutoronômio, capítulo 6, versículo 5); e a teu próximo como a ti mesmo (Levítico, capítulo 19, versículo 18).' Falou-lhe Jesus: '- Respondeste bem; faze isso, e viverás.'"
Evangelho de Lucas, capítulo 6, versículo 31.
Amar a Deus sobre todas as coisas e amar ao próximo como a si mesmo. Disse Jesus sobre estes dois preceitos: "Nesses dois mandamentos se resumem toda a lei e os profetas"; "outro mandamento maior do que estes não existe"; e "faze isso, e viverás". Os relatos evangélicos não dão margem a dúvidas. A doutrina de Jesus se resume, segundo Ele próprio declarou, a estes dois mandamentos: amar a Deus sobre todas as coisas e amar ao próximo como a si mesmo. Nesses dois mandamentos consiste, portanto, o verdadeiro Cristianismo de Jesus. Um Cristianismo cujo ensinamento essencial é perfeitamente condizente com a intuição que boa parte da humanidade tem da existência de um Deus justo e bom, cujo amor e piedade paternais só podem inspirar mais amor e piedade fraternais entre seus filhos, e não o longo cortejo de crueldades e impiedades em nome Dele cometidas, ao longo de toda a História."Tratai todos os homens como quereríeis que eles vos tratassem."
Muito mal se há feito - e ainda se faz - em nome de Deus por se atribuir a Deus o que partiu - e parte - da mente sórdida dos homens. Em Gênesis, diz-se que Deus criou o homem à sua imagem e semelhança. Os ateus afirmam que Deus é uma mentira, uma idéia criada e alimentada pela imaginação do próprio homem. Prá mim, Deus existe independentemente da vontade dos homens. Mas, de fato, cada homem cria um deus seu, à sua própria imagem e semelhança.
O leitor há de ainda estar se perguntando o porque de eu ter dado a este post o título de "Cristianismo de Jesus"; acaso haveria outro ou outros cristianismos além deste?
Dentro da Bíblia, a doutrina de Jesus vem misturada com outras doutrinas que dela divergem de modo por vezes radical. Há contradições gritantes entre a essência do ensino de Jesus e a doutrina ensinada por alguns profetas e até apóstolos que falam em nome Dele e relatam a Sua história. Dentro mesmo do Novo Testamento, há pelo menos uma afirmativa atribuída a Jesus que é tão escandalosamente injusta que não poderia jamais ter sido feita por Ele.
"Eu, porém, vos digo: todo aquele que rejeita sua mulher, a faz tornar-se adúltera, a não ser que se trate de matrimônio falso; e todo aquele que desposa uma mulher rejeitada comete um adultério." (Mateus 5,32)
http://www.bibliacatolica.com.br/01/47/5.php
"Ora, eu vos declaro que todo aquele que rejeita sua mulher, exceto no caso de matrimônio falso, e desposa uma outra, comete adultério. E aquele que desposa uma mulher rejeitada, comete também adultério." (Mateus 19,9)
http://www.bibliacatolica.com.br/01/47/19.php
Ou seja, a mulher que sofre o abandono do marido, torna-se por isso adúltera e é condenada à pena de solidão perpétua. O homem, por sua vez, que a encontrar sozinha, não poderá desposá-la, fazer dela sua companheira, por mais que a ame e por ela seja amado, porque que isso faria dele também um adúltero. É inconcebível, por ilógico e incoerente, que Jesus tenha ensinado um absurdo desses. E, no entanto, isso está lá, com todas as letras, no evangelho de Mateus.
Apesar de evidentes aberrações éticas como essa, as religiões bíblicas (católicos e protestantes), ensinam a seus fiéis que tudo o que a Bíblia contém é Cristianismo. Não é. São Paulo, por exemplo, tem uma doutrina própria, que poderia ser chamada de "paulinismo", que tem pontos de contato com o Cristianismo, mas também pontos em que com o Cristianismo mostra completo desacordo. Chamam de Cristianismo também às interpretações mirabolantes e aos dogmas criados pelos teólogos do próprio clero, penduricalhos inúteis que ao longo dos séculos foram se acumulando e tomando um tal volume que acabaram por ocultar o ensino original Daquele que todas as religiões cristãs dizem ter como Mestre.
A doutrina de Jesus é simples. O que dificulta a sua compreensão e o que causa a sua frequente deturpação, é a confusão enorme que se cria ao chamar de Cristianismo o que não é Cristianismo. A moral cristã é diferente e muito superior à moral encontrada em muitos dos sermões que se fazem nos púlpitos e em um sem número de passagens bíblicas. Por isso, quando alguém se diz adepto do Cristianismo, é justo que se pergunte: que cristianismo? O cristianismo que erradamente se atribui aos profetas do Antigo Testamento? O cristianismo que erradamente se atribui a São Paulo, exposto em suas epístolas? O cristianismo de um suposto Jesus injusto que condena e penaliza a mulher pelo pecado do homem? O cristianismo do clero católico e protestante que estabelece normas e preceitos muitas vezes contrários à caridade ensinada por Jesus? Ou o Cristianismo puro, de Jesus, resumido por Ele mesmo quando provocado pelos fariseus? A verdade é que só existe um Cristianismo: o de Jesus. O resto é produto da imaginação humana que só serve para alimentar confusão e incredulidade.
Há um jeito simples de saber o que é e o que não é cristão, o que é e o que não é Cristianismo. Tudo apreciar e julgar à luz do que o próprio Jesus asseverou ser o fundamento de Sua doutrina, que é a própria Lei de Deus. Jesus citou dois mandamentos que já constavam das antigas escrituras: amar a Deus sobre todas as coisas e amar ao próximo como a si mesmo. E disse, sobre eles: "outro mandamento maior do que estes não existe". Isso quer dizer que existem outros mandamentos além destes. Mas que todos têm um valor relativo inferior, que é determinado pelo grau de compatibilidade que tenham com eles. Deu-nos, portanto, Jesus, um meio infalível de avaliar o que é e o que é Cristianismo. Cristão é todo ensino moral que esteja de acordo, ou seja compatível, com aqueles dois mandamentos supremos, mesmo que estes ensinos não apareçam na Bíblia. Pela mesmo critério, anticristão é todo ensino moral que esteja em desacordo, ou seja incompatível, com aqueles dois mandamentos supremos, mesmo que estes ensinos estejam na Bíblia e sejam atribuídos a Deus ou a Jesus.
Se Deus é perfeito, a Lei que Dele promana também deve o ser; não pode ser uma lei contraditória. Ora, quem já leu a Bíblia sabe que contradição é o que não falta nesse livro. Se tudo o que ali se atribui a Deus fosse mesmo palavra de Deus, teria-se que, forçosamente, concluir que Deus é um deus louco, incoerente e passional, como a maior parte dos homens. Mas Deus não é contraditório. Se há tantas contradições na Bíblia não é senão pelo fato de que ela foi inteiramente concebida pelos homens, que misturaram, inadvertida ou oportunisticamente, o ensino moral, universal e atemporal, de procedência divina, com o ensino moral, local e temporal, de procedência humana.
Atribui-se nos Evangelhos a Jesus a expressão 'dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus'. Pois a missão de Jesus pode bem ser resumida numa outra frase semelhante a essa. Jesus veio ao mundo dar a Deus o que é de Deus, e a Moisés e aos profetas o que é de Moisés e dos profetas. Usando uma outra expressão também atribuída a Ele pelos evangelistas, sua missão era separar o joio do trigo, separar o que era Lei de Deus do que era lei dos homens. Infelizmente esse propósito não foi compreendido por seus seguidores. Paulo de Tarso, o São Paulo, foi o primeiro a refazer a mistura do trigo com o joio, da Lei de Deus com a lei dos homens. Convertido ao Cristianismo de Jesus, mas ideologicamente ainda prisioneiro do judaísmo, no qual foi educado, Paulo deu ao Cristianismo de Jesus uma nova feição. Ele concebeu de fato um novo cristianismo, diferente do original, em que tentou harmonizar - a meu ver, sem sucesso - suas novas e antigas crenças. O Cristianismo está, de fato, presente no Mosaísmo e no Paulinismo, mas com eles não pode ser confundido, como frequentemente se faz. Isso é um equívoco. O Cristianismo, no Mosaísmo, é uma semente minúscula coberta por uma tonelada de cascalho e pedra. O Cristianismo, no Paulinismo, é uma planta tenra coberta de ervas parasitas.
O Cristianismo nada mais é do que a Lei de Deus ensinada por Jesus. A base dessa doutrina é o amor. Qualquer ensino religioso que tenha como conteúdo algo que não seja o amor, nunca poderá ser admitido como de natureza cristã.
Silvio Melgarejo
18/04/2011