sábado, 2 de julho de 2011

Meu caminho até o Espiritismo.

(Escrito em maio e junho de 2011)

Catolicismo.


Nasci e fui criado numa família católica. Dos sete aos dezessete anos estudei num colégio jesuíta. A religião, portanto, desde muito cedo esteve presente em minha vida. Mas desde muito cedo, também, desenvolveram-se em mim o olhar crítico sobre tudo, o questionamento de qualquer forma de autoridade e a aversão a qualquer forma de tradição ou convencionalismo que significasse opressão e injustiça.

Em casa e na escola, aprendi a acreditar num Deus tão justo e bom quanto poderoso. Mas essa crença confrontada com a realidade que eu observava à minha volta, fez com que surgissem os meus primeiros questionamentos sobre o ideário católico. Cada vez mais a realidade parecia-me incompatível com a existência do Deus em que eu aprendera a crer. Por que, perguntava-me, nascem os indivíduos em condições de vida tão diferentes uns dos outros, beneficiados uns desde o berço pela saúde, fartura, conforto, educação, bons exemplos e amor, enquanto outros nascem carecendo disso tudo? Se o poder de Deus é mesmo supremo, se nada acontece senão com Seu consentimento ou por Sua vontade, por que dá Ele a uns miséria e desgraça, enquanto fortuna e felicidade concede a outros? Por que a vida de uns é tão cheia de prazeres e facilidades enquanto a de outros é tão carregada de dificuldades e sofrimentos? Por que uns parecem abençoados por Deus enquanto outros parecem por Ele abandonados à própria sorte, condenados, sem razão nenhuma aparente, a viver sob o jugo de uma espécie de maldição que só de dor e desesperança enche seus dias?

Recentemente, no dia 22 de abril, participou o Papa Bento XVI de um programa na televisão italiana, em que submeteu-se a responder perguntas feitas por alguns telespectadores selecionados. Do Japão ainda sob o impacto do violento terremoto e do devastador tsunami de 11 de março, que matou 28 mil pessoas, uma menina japonesa de sete anos, filha de italiano, disse não estar podendo brincar no parque. E perguntou-lhe:

"Por que as crianças têm de estar tão tristes? Estou perguntando ao papa, que fala com Deus, para me explicar".

Bento XVI respondeu:

"Não temos as respostas, mas sabemos que Jesus sofreu como vocês, inocente, e que o Deus verdadeiro, que se mostra em Jesus, está junto com vocês. Isto me parece muito importante, ainda que não tenhamos respostas, que a tristeza permaneça.”

E acrescentou:

"Um dia vamos entender que esse sofrimento não era vazio, não foi por acaso, mas por trás dele há um projeto bom, de amor".

Foi o que sempre ouvi dos católicos mais fervorosos, sempre que lhes expunha minhas inquietações. Que a distribuição da felicidade e da infelicidade era feita conforme a vontade de Deus e que nós deveríamos aceitá-la confiantes e resignados. Nunca me conformei com isso, com essa gritante contradição entre o que me diziam de Deus e a realidade produzida ou, pelo menos, consentida por Ele. Desde garoto, eu pensava em duas conclusões possíveis para isso que observava. Ou Deus não era justo e bom como me diziam e eu acreditava ou deveria haver alguma explicação para essa aparente contradição fora do âmbito do Catolicismo. Naquele momento eu não admitia outra senão esta última hipótese. A falta de respostas satisfatórias a perguntas que eu julgava fundamentais para sustentar a minha fé, foi afrouxando gradativamente os laços que me ligavam à religião de meus pais e avós. Quanto menos católico me achava, mais livre me sentia prá seguir a minha busca por respostas e mais predisposto a ouvir novas verdades. Até que aqueles laços se desfizeram por completo. Eu não era mais católico.

Mas não foram só as dúvidas filosóficas que me afastaram do Catolicismo. Incomodavam-me, também, o excessivo convencionalismo e o excessivo formalismo reinantes na Igreja; não me conformava com a existência de dogmas, essas verdades absolutas, protegidas das luzes da razão, verdades que não podem ser questionadas nem submetidas à crítica; tinha dificuldade para entender, embora tivesse feito o catecismo, o significado simbólico e prático dos rituais e dos sacramentos cuja beleza, não obstante, sempre apreciei; via e até hoje vejo como injustificável a ordem hierárquica que dá superioridade ao clero em relação aos leigos e, dentro do próprio clero, do homem em relação à mulher. Eram muitas as dúvidas, os questionamentos e as críticas que eu tinha desde muito cedo ao Catolicismo. Mas foi a Igreja Católica, devo reconhecer, a escola onde aprendi, levado por minha mãe, as primeiras letras da fé que até hoje tenho. Por isso, que não é pouco, lhe sou imensamente grato. A Igreja Católica, além disso, teve e tem em seus quadros alguns dos homens e mulheres mais admiráveis de que já tive notícia, homens e mulheres que são prá mim referências, exemplos de como um verdadeiro cristão deve passar seus dias na Terra.

Durante toda a minha infância, ir a missa foi uma obrigação que não raro cumpri com prazer, apesar das perguntas sem resposta se avolumarem cada vez mais em minha cabeça de criança. Aos poucos fui percebendo a diferença entre a religião como tradição e a religião como fé. Não nego que as duas podem andar juntas interagindo de forma positiva, mas acho que a tradição religiosa muitas vezes se faz algoz involuntária da fé religiosa. Muita gente boa vê sua fé minguar pelo equívoco de agarrar-se à tradição como se ela fosse a cruz redentora de Cristo. A tradição pode transmitir valores sob determinada forma de uma geração para outra. Mas cabe unicamente àquele que recebe o legado de seus antepassados usar o próprio discernimento para avaliar o que serve e o que não serve como alimento espiritual para nutrir a fé na sua alma. Pois eu, àquela altura, tinha diante de mim dois imperativos que julgava incompatíveis. A fé e a tradição. De um lado o dever de ser fiel à tradição, de outro o desejo de buscar respostas que nutrissem minha fé. Quando andava ali pelo meio da adolescência, esse dilema, felizmente, já não existia mais. Já tinha madura a convicção de não ser mais católico e assim que tive chance, quando encontrei ocasião oportuna, rompi com a obrigação de ir à missa. Afastei-me da religião e de seus cultos, mas mantive a crença na existência do Deus justo e bom e também do seu filho, Jesus Cristo.


Mediunidade.


Eu devia ter uns 17 para 18 anos quando tive meu primeiro contato com o fenômeno mediúnico. Tinha um grupo de amigos e, entre eles, alguns começaram a apresentar comportamentos estranhos em certas ocasiões. Diziam ter visões, ouvir vozes e falavam como se fossem outras pessoas, assumindo temporariamente personalidades diferentes das suas próprias. Eu não tinha como saber se eram reais as visões e as vozes porque eu mesmo não via ou ouvia nada. Tampouco poderia saber se as personalidades que eles assumiam eram de espíritos ou se eram produzidas por suas próprias psiques. Mas via e afligia-me com o sofrimento daqueles que eram à época meus melhores amigos. Alguns estavam tão apavorados que cheguei a temer por suas sanidades mentais. O medo deles era real. Disso eu não podia duvidar. Só não conseguia encontrar explicação cabal para o que estava acontecendo. Acreditava, por acreditar, na sobrevivência do homem após a morte e, honestamente, nunca vi razões prá duvidar da comunicabilidade dos vivos com os mortos. Mas seria esse, mesmo, o caso dos meus amigos, como se alegava?

Eu não tinha, portanto, um entendimento claro do que se passava, não sabia como lidar com tudo aquilo e preocupava-me com a situação daqueles nos quais os fenômenos se davam com maior frequência e intensidade. Um destes, o João, ligou-me certa vez de madrugada, dizendo-se apavorado com as visões que estava tendo. Tentei tranquilizá-lo, aconselhando-o a acender a luz de seu quarto. Ele disse já ter feito isso mas que o pai apagara. Disse, então, que ele deveria contar ao pai o seu problema, mas ele alegou que o pai, católico, como ele, jamais admitiria que ele pudesse estar vendo espíritos, acusaría-lhe de estar sob efeito de drogas. Pediu-me, afinal, para passar a noite em minha casa onde, na sala, poderia dormir de luz acesa. Eu consenti e ele veio. Conversamos e fizemos juntos uma prece, creio que o Pai Nosso. Impressionou-me o estado de nervos desse meu amigo. Ele estava realmente apavorado. Disse-lhe que ajudaria como pudesse, que ele poderia passar a noite em minha casa sempre que achasse necessário, que eu estaria a seu lado quando fosse preciso; mas que nada disso resolveria o seu problema, um problema que já àquela altura, a meu ver, estava ficando sério. O medo intenso, caso se prolongasse por mais tempo, poderia abalar perigosamente o seu equilíbrio psíquico. Temia que ele enlouquecesse. Disse-lhe que, infelizmente, mais do que a casa aberta e a solidariedade de amigo, não poderia lhe oferecer. Acreditava que o problema tinha que ser encarado de frente, que uma solução tinha que ser buscada e que o primeiro passo nesse sentido seria procurar alguém que entendesse “dessas coisas” (eu ainda não sabia que o nome do que ele tinha era “mediunidade”). Disse que lamentava o seu sofrimento mas que não poderia ajudar por ser tão ignorante quanto ele no tema da comunicação com os mortos. Perguntei a ele “você conhece alguém que tenha conhecimentos sobre isso?”. Ele respondeu que sim, que uma colega de colégio era espírita. Eu, entusiasmado, disse “pois, então, vá procurar essa garota, peça a ela uma orientação, uma ajuda, uma solução, se possível, antes que você enlouqueça de medo”. Ele não se mostrou muito animado com a idéia. Acho que o preconceito religioso falou mais alto.

Até então eu era apenas espectador dos relatos e das atitudes estranhas dos meus amigos. Mas, a partir de um certo momento, comecei eu próprio a viver o drama que eles viviam. De forma atenuada, é verdade. Nunca vi, nem ouvi nada, tampouco incorporei espíritos. Mas passei a ter estranhas e inexplicáveis sensações, como taquicardia, frio em pleno verão e voz trêmula. A princípio julguei estar doente. Mas com o tempo passei a observar que eu sentia tudo isso sempre momentos antes de um dos meus amigos manifestar algum daqueles fenômenos. Quando notei que essa coincidência era constante, conclui que não poderia ser casual. Passei, desde então, a admitir a hipótese de estar sentindo a presença de espíritos antes que eles se manifestassem aos meus amigos, pela visão e audição espirituais, ou através deles, incorporando. Acreditei que essa forma mais sutil de mediunidade poderia ser só o começo de um processo que poderia me levar à mesma situação em que se encontravam os outros, vendo, ouvindo e incorporando espíritos, de forma descontrolada. Fiquei preocupado e, por que não dizer, tive mêdo. Procurei João, o amigo que tinha uma colega espírita, contei-lhe o que se passava comigo, e disse-lhe que queria conversar com ela, pedir-lhe uma explicação, uma orientação, uma ajuda.

Algo que me chamava a atenção e que me levava cada vez mais a crer estar diante de reais fenômenos mediúnicos é que, dentre os amigos que viam, ouviam ou incorporavam espíritos, alguns não se conheciam, não conviviam, não tinham contato entre si, pertenciam a ambientes sociais diferentes; não sabiam, ademais, de minha parte, o que com os outros se passava. Isso, prá mim, tornava impossível que se influenciassem mutuamente, sugestionando-se uns pelos relatos dos outros. A essa altura, eu já dava como certa a explicação que antes tinha apenas como hipótese a ser confirmada. Eu já sabia o que se passava. Eram, realmente, os espíritos dos mortos que se manifestavam para e através de mim e dos meus amigos médiuns. O que eu queria agora era saber mais sobre isso e, sobretudo, saber o que fazer com essa nova faculdade que víamos nascer em nós.


Espiritismo.


João falou, então, com Isabela, a colega espírita, e marcaram uma visita nossa à casa dela para conversarmos com dona Iolanda, sua mãe, que era dirigente de um centro. Contamos à dona Iolanda o que estávamos passando, ela ouviu-nos, deu-nos algumas explicações que confirmavam a tese das comunicações mediúnicas, e fez-nos uma exposição resumida sobre o que era a doutrina espírita. O impacto de suas palavras, em mim, não poderia ter sido maior, nem melhor do que foi. Um universo novo de idéias começou ali a me ser revelado e eu me senti subitamente tomado pela alegria imensa de estar encontrando as primeiras respostas razoáveis àquela série de perguntas sem resposta que eu me fazia desde o tempo de menino. O Espiritismo parecia afinal desvendar mistérios e decifrar enigmas sobre a vida e sobre a morte, na medida em que trazia para minha reflexão informações sobre a imortalidade da alma, sobre a comunicabilidade do mundo dos vivos com o mundo dos mortos – a mediunidade – , sobre a existência de leis morais naturais, de uma lei natural do progresso e de uma lei natural de causa e efeito para a vida moral dos homens, além do mecanismo educativo da reencarnação, em que o espírito imortal, através de vidas sucessivas em diferentes planetas e corpos biológicos, tem a oportunidade de reparar erros e desenvolver virtudes no longo, lento e contínuo processo de evolução que o levará, inexoravelmente, à perfeição moral e intelectual. Aprendi que a moral espírita é a moral cristã resumida de forma concisa por Jesus quando disse que os dois maiores mandamentos da lei de Deus são amar a Deus sobre todas as coisas e amar ao próximo como a si mesmo. Segundo o Espiritismo, os espíritos são criados por Deus simples e ignorantes, mas perfectíveis e predestinados a conquistar, pelo esforço próprio, a perfeição e a felicidade, dela decorrente, que buscam por um impulso natural, constante e irresistível desde o nascimento. A felicidade real, profunda e definitiva, para o Espiritismo, será sempre efeito do cumprimento da lei de Deus, inscrita, antes do que em qualquer outro lugar, na própria consciência dos homens.

Não sei o quanto, disso tudo, consegui assimilar já naquela curta palestra que nos fez dona Iolanda. Sei que saí de sua casa maravilhado e feliz. O Espiritismo me dava elementos valiosos prá eu entender como se processa a justiça de Deus. Encontrava, afinal, uma religião ou filosofia cujos princípios confirmavam a idéia do Deus justo e bom em que eu aprendi a crer desde a minha infância. Aos poucos fui aprendendo que a doutrina espírita foi revelada por Deus, pelas vozes dos espíritos e através dos médiuns, para consolar os homens, dar-lhes razões para aceitarem com resignação e paciência a dor que não encontra remédio, para lutarem pela própria reforma íntima, para cultivarem a alegria e a esperança, mas sobretudo, para confiarem em Deus e na vida futura.

Dona Iolanda convidou-nos a visitar o centro que dirigia para uma conversa com a presidente da instituição, dona Brunilde. Foi assim que conheci o Lar de Teresa, que passei a ter como um abrigo acolhedor e como um porto seguro nos momentos mais atribulados. Dona Brunilde nos recebeu e muito carinhosamente nos deu as boas vindas. Conversou conosco e nos deu as primeiras orientações. O que estávamos vivendo era o afloramento da faculdade mediúnica, que precisaria ser educada prá ser produtiva e não causar prejuízo ao nosso equilíbrio psíquico. Recomendou que iniciassemos imediatamente o tratamento de passes espirituais e que, na mesma semana, ingressassemos numa das turmas de um curso de preparação de médiuns ministrado no próprio centro. Em pouco tempo fomos convocados a participar da “mesa mediúnica”, atividade na qual, em torno de uma mesa, em ambiente reservado, os médiuns da casa se reuniam para o intercâmbio com o mundo dos espíritos.

Foi frustrante e ao mesmo tempo surpreendente a minha curta passagem pela mesa mediúnica do Lar de Teresa. Frustrante, porque nada aconteceu comigo em termos de fenômeno. Fui um mero espectador dos movimentos e das falas dos demais participantes, que expressavam, cada qual segundo o tipo de mediunidade que tinha, as emoções e as idéias dos espíritos presentes. Devo ter ido a duas ou três reuniões, apenas. Na última, veio a surpresa. Um dos médiuns, após um período de grande recolhimento e concentração, em que escrevia, na penumbra da sala, alguma coisa, a lápis, numa folha branca de papel, disse à dona Brunilde, que dirigia a atividade, ter recebido naquele momento uma mensagem e que tinha a forte intuição de que era destinada “a este rapaz”, apontando prá mim, que sentava a seu lado. Eu levei um susto. “Os espíritos me mandaram uma mensagem?!!! Mas, como, por que prá mim?” Perplexo, eu não consegui me concentrar mais prá ouvir a leitura do texto recebido pelo médium. Não ouvi nada. Ao fim da reunião, procurei saber com os demais participantes qual era o conteúdo da mensagem. Tentei e não consegui uma cópia. Afinal, alguém, não me lembro quem, disse que tratava-se de uma orientação dos espíritos, para que eu não me preocupasse tanto com os fenômenos mediúnicos, que estudasse a doutrina espírita, que trabalhasse nas obras do bem e que procurasse melhorar como pessoa. Nada mais consegui que me dissessem além disso. Mas interpretei o que ouvi como uma indicação de que eu não seria mesmo um médium como eram alguns dos meus amigos e os outros que encontrei na mesa mediúnica e que, portanto, não deveria retornar mais a aquela atividade. Nunca mais tive as sensações estranhas que me levaram a buscar explicações no Espiritismo e isso me fez crer que a minha mediunidade tinha “ido embora”, que fora circunstancial, não teria sido um chamado de Deus para o trabalho mediúnico e sim um modo Dele me aproximar do Espiritismo afim de permitir que eu pudesse me beneficiar de tudo aquilo que a doutrina tem de fato me proporcionado até os dias de hoje.

Mais de trinta anos depois daquela conversa com dona Iolanda, não sei dizer se me tornei uma pessoa melhor por influência do Espiritismo. Mas tenho absoluta certeza de que, sem ele, eu poderia ter sucumbido ante às dificuldades da vida. Nos momentos mais graves e dolorosos, a doutrina espírita foi a luz que me ajudou a enxergar a bondade e a justiça de Deus por trás da nuvem negra e espessa dos problemas. Foi a ponte que me levou à convicção de que não estou só no mundo, de que a morte não existe e de que, dentro de mim e no mundo, a vitória do bem e da justiça é um destino inexorável. Caminhar pela difícil e perigosa estrada da vida, trazendo consigo essas certezas, é o mesmo que adentrar a noite sabendo que ela leva ao dia. Coragem é a atitude de quem tem fé. E fé é a confiança íntima que se tem em algo ou alguém. A doutrina espírita dá razões bastas para que o indivíduo tenha confiança no potencial imenso que traz dentro de si, como parte integrante da sua própria natureza, e razões bastas para que confie em Deus e na vida futura que Ele nos reserva como prêmio pelos passos que dermos.

Caminho, há quase 49 anos, a bordo do corpo que Deus me deu, enfrentando como todo humano os acidentes e intempéries dessa viagem que é a vida biológica, curto trajeto de uma jornada ainda maior na infinita estrada da evolução do espírito. Quando uma tempestade se abate sobre mim e não é possível enxergar os limites da trilha, quando a fadiga me toma e sinto faltarem-me forças, busco o abrigo da fé e aí repouso minha alma cansada. Espero confiante porque sei que não há tormenta eterna, como não há noite sem fim. Alternam-se na vida os bons e maus momentos, as alegrias e tristezas, os prazeres e dores, como na natureza os dias e noites, os dias de sol e os temporais. Por tudo isso passo, como passam todos os homens, certo, graças ao Espiritismo, de que temos todos um mesmo destino inexorável. Alcançar um estado de perfeição moral e intelectual tão elevado que nos permitirá compreender e sentir aquilo que hoje pode nos parecer ilusão ou sonho. Nesse dia, a felicidade já não será mais um punhado de prazeres fugazes, dispersos ao longo do tempo, mas um estado permanente e estável. A felicidade nesse dia será profunda, intensa e definitiva. Será a estação final da longa viagem proposta aos homens por Jesus ao Reino de Deus, onde a paz, a harmonia e a ventura, são patrimônios inalienáveis do espírito que, pelo esforço próprio e orientado pelos mecanismos educativos da vida, desenvolve, até tornar parte de sua natureza, a capacidade sublime de amar ao próximo como a si mesmo.